Resoluções

29 de dezembro de 2017 às 17:13

Daniel Medeiros
Minha primeira resolu&ccedil;&atilde;o de fim de ano &eacute; chegar ao fim do ano. Ou, pensando melhor: que o ano tenha um fim e que ele chegue. E nem precisa ser logo. Basta que seja minuto a minuto, hora a hora, dia a dia. Simples assim. 2017 foi um ano &iacute;mpar. N&atilde;o teve como ele.&nbsp; Sim, &eacute; uma redund&acirc;ncia. Mas estou falando s&eacute;rio. E nisso 2017 foi igual a todos os outros anos. N&atilde;o, n&atilde;o &eacute; um paradoxo. Nem uma charada. Apenas pense nisso.<br /> <br /> Normalmente fazemos resolu&ccedil;&otilde;es porque parece que a conta n&atilde;o fecha. A resolu&ccedil;&atilde;o de fim de ano &eacute; uma esp&eacute;cie de &ldquo;esperem pra ver&rdquo; ou &ldquo;voc&ecirc;s n&atilde;o est&atilde;o acreditando?&rdquo; Isso tudo porque cremos que estamos em uma corrida, ou em um jogo, e as pontua&ccedil;&otilde;es que obtivermos poder&atilde;o ser trocadas ao final. Mas somente se chegarmos l&aacute;. Muito j&aacute; se falou sobre esse &ldquo;l&aacute;&rdquo;, mas no fundo (como sabemos), &ldquo;l&aacute;&rdquo; &eacute; um lugar que n&atilde;o existe. N&atilde;o &eacute; um corpo mais esguio, uma l&iacute;ngua mais fluente, um curso de programa&ccedil;&atilde;o a mais no curr&iacute;culo. N&atilde;o &eacute; um filho, um novo casamento, a viagem para a &Iacute;ndia. O l&aacute; est&aacute; aqui, dentro da gente. &Eacute; esse vazio que alguns mais c&eacute;ticos chamam de exist&ecirc;ncia. Eu chamo apenas de vida.<br /> <br /> Estamos aqui, essa &eacute; a grande verdade. E estar aqui dura por muito tempo. Tanto que nos perdemos. N&atilde;o somos capazes de guardar na mem&oacute;ria todo o tempo que estamos por aqui. Por isso, criamos uma marca&ccedil;&atilde;o: horas, dias, meses, anos. Mas, mesmo assim, ainda &eacute; muita coisa. Ent&atilde;o resolvemos destacar apenas alguns pontos desse tempo imenso: um dia para o anivers&aacute;rio; um para a m&atilde;e, outro para as crian&ccedil;as, um para a outra pessoa que est&aacute; naquele momento com a gente. Ao longo dos 365 dias de um &uacute;nico ano, conseguimos ocupar uns dez, doze dias com esses eventos. O resto &eacute; uma imensa plan&iacute;cie de minutos e horas passando entre um afazer e outro, uma s&eacute;rie ou outra, um reality show e mais um, at&eacute; mesmo uma novela, pelo menos at&eacute; o fim do primeiro m&ecirc;s de exibi&ccedil;&atilde;o.<br /> <br /> E ent&atilde;o o ano vai acabando. Lembramos que ele passou e que foi longo, moroso, cansativo. N&atilde;o, n&atilde;o! Existiram momentos maravilhosos! Aqueles dez ou doze momentos inesquec&iacute;veis. Ou foram s&oacute; uns oito ou nove dessa vez? Ah, mas no ano que vem vai ser diferente, vai come&ccedil;ar diferente, vai terminar diferente, vai ser todo ele diferente.<br /> <br /> Evidentemente, n&atilde;o nos perguntamos como isso &eacute; poss&iacute;vel, pois vivemos em um trem e a &uacute;nica chance de ser diferente &eacute; se ele descarrilar. No mais, nossa margem de escolha &eacute; ir para a cabine, olhar a janela ou ir para o bar tentar conversar com algu&eacute;m. Ou - e &eacute; a&iacute; que quero chegar - tudo isso &eacute; s&oacute; uma forma de dizer que esquecemos o mais b&aacute;sico e &oacute;bvio poss&iacute;vel. Se n&atilde;o h&aacute; necessariamente um &ldquo;a&iacute;&rdquo;, h&aacute;, sem sombra de d&uacute;vida, um &ldquo;aqui&rdquo;, esse lugar e esse momento no qual me encontro. E n&atilde;o &eacute; a coisa mais ruim do mundo. Ali&aacute;s, na categoria ruim, h&aacute; centenas de situa&ccedil;&otilde;es que nem compensa come&ccedil;ar a enumerar.<br /> <br /> E aqui, nesse momento da minha reflex&atilde;o, lembro da hist&oacute;ria contada pelo escritor americano David Foster Wallace: &quot;dois jovens peixes est&atilde;o nadando por a&iacute; e, por acaso, encontram um peixe mais velho nadando na dire&ccedil;&atilde;o contr&aacute;ria, que acena para eles e diz &lsquo;Bom dia, meninos, como est&aacute; a &aacute;gua?&rsquo; E os dois jovens peixes continuam nadando por um tempo, at&eacute; que eventualmente um deles olha para o outro e fala: &lsquo;O que diabos &eacute; &aacute;gua?&rsquo;. &Eacute; isso. &Eacute; o que est&aacute; a&iacute;, o tempo todo, o que eu desejo que continue. Um trem sobre os trilhos. Um avi&atilde;o no ar. O resto, ora, s&atilde;o meses e dias e horas e minutos. Come&ccedil;ando agora!<br /> &nbsp;<br /> <b><i><img src="/uploads/image/artigos_daniel-medeiros_doutor-em-educacao-historica-ufpr_sb.jpg" align="left" width="60" hspace="3" height="80" alt="" /><br /> <br /> <br /> Daniel Medeiros </i></b>&eacute; doutor em Educa&ccedil;&atilde;o Hist&oacute;rica pela UFPR e professor no Curso Positivo. <br />