Reforma trabalhista: oportunidades para pactuar mudanças

19 de fevereiro de 2018 às 15:43

Clemente Ganz Lúcio
A agenda da reforma trabalhista e sindical est&aacute; pautada na sociedade brasileira h&aacute; algum tempo, em fun&ccedil;&atilde;o de v&aacute;rios motivos, como as mudan&ccedil;as na base produtiva e na divis&atilde;o internacional do trabalho, a expans&atilde;o do setor de servi&ccedil;os e a dissemina&ccedil;&atilde;o de novas tecnologias e do trabalho imaterial - fatores que impactam o emprego e as empresas e demandam transforma&ccedil;&otilde;es do sistema de rela&ccedil;&otilde;es do trabalho. Desde j&aacute;, ressalta-se tamb&eacute;m a necessidade da reforma tribut&aacute;ria, pol&iacute;tica, eleitoral, agr&aacute;ria, do solo urbano, da educa&ccedil;&atilde;o, do Estado e dos servi&ccedil;os. Longa &eacute; a lista das in&uacute;meras reformas urgentes que est&atilde;o paradas.<br /> <br /> No primeiro semestre deste ano, a C&acirc;mara dos Deputados e o Senado Federal aprovaram, em rito c&eacute;lere e sem debate p&uacute;blico, a Lei 13.467/2017 que altera 117 artigos e mais de 200 dispositivos da CLT &ndash; Consolida&ccedil;&atilde;o das Leis do Trabalho.<br /> <br /> Desde ent&atilde;o, at&eacute; sua entrada em vigor, em meados de novembro -&nbsp; per&iacute;odo de vacatio legis-, o debate fez emergir uma extensa lista de problemas, indicando que a lei aprovada poder&aacute; ampliar a inseguran&ccedil;a dos trabalhadores e os conflitos entre capital e trabalho, al&eacute;m de causar in&uacute;meros impactos sobre a atividade sindical, o papel da Justi&ccedil;a do Trabalho e o funcionamento do sistema de rela&ccedil;&otilde;es de trabalho. Observe-se que, apesar da extens&atilde;o e profundidade das medidas, n&atilde;o houve previamente mensura&ccedil;&atilde;o das poss&iacute;veis consequ&ecirc;ncias sociais, econ&ocirc;micas, trabalhistas e fiscais.<br /> <br /> Na semana em que a Lei entrou em vigor, o governo encaminhou a Medida Provis&oacute;ria n&ordm; 808 que efetuava algumas poucas mudan&ccedil;as na extensa Lei. No curto prazo legislativo, a MP recebeu 967 emendas parlamentares. O fato de a maioria das emendas ter sido proposta por deputados, e n&atilde;o por senadores, indica que a Lei e a MP n&atilde;o contemplaram totalmente a casa parlamentar que lhes deram origem e, aparentemente, n&atilde;o satisfizeram integralmente sequer os congressistas que apoiam o governo: embora a maior parte das emendas tenha sido proposta por parlamentares de oposi&ccedil;&atilde;o (632), h&aacute; um n&uacute;mero expressivo de altera&ccedil;&otilde;es sugeridas por aqueles que, em tese, apoiam o governo (226), entre eles, PMDB (42), PSDB (45), PTB (35) e PP (33), entre outros.<br /> <br /> A compila&ccedil;&atilde;o das emendas revela o desejo de mudan&ccedil;as na maior parte dos temas da nova legisla&ccedil;&atilde;o. Os pontos de maior aten&ccedil;&atilde;o s&atilde;o o trabalho intermitente, o princ&iacute;pio do &ldquo;negociado sobre o legislado&rdquo;, a condi&ccedil;&atilde;o da empregada gestante ou lactante, o conceito de remunera&ccedil;&atilde;o e o dano extrapatrimonial.<br /> <br /> Ademais, dezenas de emendas sobre os outros assuntos tratados pela MP foram apresentadas, como a regulamenta&ccedil;&atilde;o da terceiriza&ccedil;&atilde;o, do funcionamento da Justi&ccedil;a do Trabalho e da contribui&ccedil;&atilde;o sindical, para dar alguns exemplos. Uma contagem simples das emendas oferecidas por tema n&atilde;o indica a import&acirc;ncia relativa de cada uma delas, nem o peso pol&iacute;tico que as respaldam, mas revela a amplitude dos debates que dever&atilde;o ocorrer a fim de contemplar todo o leque de sugest&otilde;es.<br /> <br /> O contexto de debates abre nova oportunidade para o Congresso Nacional dar outro rumo e sentido &agrave; reforma trabalhista, possibilitando que se promovam altera&ccedil;&otilde;es da legisla&ccedil;&atilde;o trabalhista e do sistema de rela&ccedil;&otilde;es de trabalho a partir do di&aacute;logo social complexo entre empregadores e trabalhadores. Permite pactuar, no espa&ccedil;o do Congresso Nacional, o sentido das mudan&ccedil;as e definir as novas regras que reger&atilde;o o sistema de rela&ccedil;&otilde;es de trabalho e a legisla&ccedil;&atilde;o trabalhista, abrindo a perspectiva de reorienta&ccedil;&atilde;o das transforma&ccedil;&otilde;es para valoriza&ccedil;&atilde;o, fortalecimento e investimento na negocia&ccedil;&atilde;o e em mecanismos para solu&ccedil;&atilde;o &aacute;gil de conflitos. Possibilita ainda que sejam estabelecidos processos e mecanismos inteligentes de transi&ccedil;&atilde;o para as novas regras.<br /> <br /> O debate promove oportunidade para estimar os impactos das mudan&ccedil;as na vida das empresas e dos trabalhadores, em termos de previd&ecirc;ncia e receita fiscal, entre outros; al&eacute;m de proporcionar a chance de ado&ccedil;&atilde;o de novos mecanismos de monitoramento das medidas implementadas, com vistas a adequar as regras &agrave;s inten&ccedil;&otilde;es do acordo original.<br /> <br /> Por isso, os Presidentes das duas Casas e os parlamentares t&ecirc;m a oportunidade de, no tr&acirc;mite da MP 808, conduzir um novo pacto entre empregadores e trabalhadores, que, por meio do di&aacute;logo social, poder&aacute; operar as transforma&ccedil;&otilde;es necess&aacute;rias na legisla&ccedil;&atilde;o trabalhista e no sistema de rela&ccedil;&otilde;es de trabalho, de forma que ambos sejam, verdadeiramente, fatores impulsionadores da constru&ccedil;&atilde;o de um pa&iacute;s economicamente desenvolvido e socialmente justo.<br /> <br /> <i><b><img src="http://www.novoeste.com/uploads/image/artigos_clemente-ganz-lucio_sociologo-diretor-tecnico-dieese.jpg" width="60" hspace="3" height="80" align="left" alt="" /><br /> <br /> <br /> Clemente Ganz L&uacute;cio</b></i> &eacute;&nbsp; Soci&oacute;logo, diretor t&eacute;cnico do DIEESE, membro do CDES &ndash; Conselho de Desenvolvimento Econ&ocirc;mico e Social e do Grupo Reindustrializa&ccedil;&atilde;o