Governabilidade depende de respaldo popular

06 de março de 2018 às 15:12

Luiz Carlos Borges da Silveira
Na democracia, o sucesso do governo depende da credibilidade e apoio que tenha junto ao povo para conceber, aprovar e implementar projetos avan&ccedil;ados, por mais impopulares que possam ser ou parecer. O executivo precisa ter o povo do seu lado, porque pela iner&ecirc;ncia do regime haver&aacute; um legislativo, oposi&ccedil;&atilde;o sistem&aacute;tica e negocia&ccedil;&otilde;es que mais emperram do que colaboram. <br /> <br /> Propostas e reformas estruturais s&atilde;o geralmente impopulares, preconizam mudan&ccedil;a, avan&ccedil;o, modernidade. Sendo impopulares n&atilde;o contam com a boa vontade dos congressistas que dependem das bases, de caciques regionais, de alian&ccedil;as nem sempre leg&iacute;timas e de votos para reelei&ccedil;&atilde;o, portanto jamais h&atilde;o de querer desagradar aos que concederam o mandato, procuram negociar, clamam pela libera&ccedil;&atilde;o de emendas or&ccedil;ament&aacute;rias, querem verbas e obras para suas regi&otilde;es visando justificar apoio a um projeto visto como impopular. <br /> <br /> &Eacute; oportuno lembrar o governo Collor que, inegavelmente, ao menos no seu primeiro ano tinha o apoio popular. Fora o primeiro presidente eleito ap&oacute;s o regime militar e concentrou a campanha em propostas populares e ataques ao status quo pol&iacute;tico, econ&ocirc;mico e social: maraj&aacute;s, infla&ccedil;&atilde;o, injusti&ccedil;a social... Tendo o povo a apoi&aacute;-lo, Collor apresentou e conseguiu aprovar no Congresso medidas impopulares, como o confisco da poupan&ccedil;a, sem necessitar negociar ou praticar o conhecido &lsquo;toma l&aacute;, d&aacute; c&aacute;&rsquo;. Os parlamentares n&atilde;o haveriam de querer contrariar uma administra&ccedil;&atilde;o nacional respaldada pela vontade popular.<br /> <br /> Na sequ&ecirc;ncia, o governo Itamar Franco elaborou e implantou o Plano Real, fato marcante, pois os brasileiros n&atilde;o acreditavam mais em planos ou pacotes ap&oacute;s tantos fracassos. No Real acreditaram e apoiaram, pois o aval era de Itamar, pol&iacute;tico &iacute;ntegro, passado limpo e firmeza de decis&otilde;es. O povo acreditava em Itamar e o apoiava, por isso acreditou e apoiou o Plano Real.<br /> <br /> Hoje, vemos um governo com dificuldades, sem respaldo popular, alto e persistente &iacute;ndice de reprova&ccedil;&atilde;o e tendo sua legitimidade questionada. Tudo isso dificulta o entendimento com o Congresso, os parlamentares costumam tirar proveito quando o governante est&aacute; enfraquecido. Michel Temer tem tentado acertar, &eacute; verdade, por&eacute;m esbarra em obst&aacute;culos pol&iacute;ticos e pessoais, sendo alvo de investiga&ccedil;&otilde;es que embora ainda n&atilde;o provadas produzem desgastes, advindo da&iacute; problemas para aprovar medidas importantes e necess&aacute;rias, como as reformas, entre as quais a da Previd&ecirc;ncia, cujo projeto original est&aacute; mutilado por tantas altera&ccedil;&otilde;es para atender l&iacute;deres, grupos e partidos inclusive da pr&oacute;pria base governista. (A vota&ccedil;&atilde;o dessa reforma acabou prejudicada constitucionalmente devido ao decreto de interven&ccedil;&atilde;o na seguran&ccedil;a p&uacute;blica do estado do Rio de Janeiro).<br /> <br /> Entendo que um dos obst&aacute;culos &agrave; plena governabilidade de Temer resida no compreens&iacute;vel questionamento de sua legitimidade. Afinal, deveria ter sofrido id&ecirc;ntica penaliza&ccedil;&atilde;o aplicada a ent&atilde;o presidente Dilma Rousseff, pois era integrante da mesma chapa e fazia parte do governo com a participa&ccedil;&atilde;o de ministros de seu partido. Ficou a impress&atilde;o de haver existido trai&ccedil;&atilde;o e isso a opini&atilde;o p&uacute;blica n&atilde;o perdoa.<br /> <br /> Entretanto, acredito que as elei&ccedil;&otilde;es deste ano podem trazer algum alento e esperan&ccedil;a, principalmente se houver consciente renova&ccedil;&atilde;o do Congresso e a investidura de um presidente consagrado pelo voto, legitimado nas urnas, provavelmente em dois turnos. E que ent&atilde;o decida atacar os problemas estruturais, gestar projetos de moderniza&ccedil;&atilde;o e igualmente fazer as reformas aproveitando inclusive que n&atilde;o sendo eleitoral o pr&oacute;ximo ano, inexistir&aacute; a necessidade de barganha com um Congresso viciado.<br /> <br /> A expectativa de supera&ccedil;&atilde;o &eacute; tamb&eacute;m baseada na potencialidade do Brasil, pa&iacute;s que j&aacute; deu provas de recuperar-se de crises criadas por maus pol&iacute;ticos e incompetentes gestores p&uacute;blicos.<br /> <br /> Nosso pa&iacute;s &eacute; agraciado em riquezas naturais, formado por povo de &iacute;ndole pac&iacute;fica e senso de trabalho s&eacute;rio. Conta com setor empresarial empreendedor, moderno e tecnologicamente avan&ccedil;ado parque produtivo. Esse fato &eacute; vis&iacute;vel, pois apesar dos desequil&iacute;brios e desgastes pol&iacute;ticos e administrativos, o agroneg&oacute;cio garante o &ecirc;xito da balan&ccedil;a comercial, desemprego est&aacute; em processo de redu&ccedil;&atilde;o, PIB em crescimento, ainda que lento, juro b&aacute;sico em patamar aceit&aacute;vel, infla&ccedil;&atilde;o sob controle &ndash; al&eacute;m de outros indicadores. Tudo isto ocorre independentemente de trope&ccedil;os do governo, onde at&eacute; a simples e natural troca de ministro vira crise.<br /> <br /> Tenho certeza que dificuldades t&ecirc;m seu lado positivo porque agu&ccedil;am a criatividade e conduzem a uma reflex&atilde;o madura sobre erros cometidos. Espero que reforcem o que tenho pregado no sentido de que os brasileiros em geral entendam a import&acirc;ncia e o valor da participa&ccedil;&atilde;o pol&iacute;tica para mudar. A pol&iacute;tica em si &eacute; boa e base essencial na democracia, o problema s&atilde;o os maus pol&iacute;ticos, os quais o povo pode defenestr&aacute;-los leg&iacute;tima e soberanamente pelo instrumento mais ic&ocirc;nico da democracia: o voto. Todavia, para tanto &eacute; necess&aacute;rio participar ativa, efetiva e positivamente. <br /> <br /> <i><b><img src="http://www.novoeste.com/uploads/image/artigos_luiz-carlos-borges-da-silveira.jpg" width="60" hspace="3" height="80" align="left" alt="" /><br /> <br /> <br /> Luiz Carlos Borges da Silveira</b></i> &eacute; empres&aacute;rio, m&eacute;dico e professor. Foi Ministro da Sa&uacute;de e Deputado Federal.