Igualdade salarial entre homens e mulheres: um tema (ainda) polêmico em pleno 2018

08 de março de 2018 às 10:56

Paula Paschoal
Sempre que o Dia Internacional da Mulher se aproxima, aproveito para fazer um balan&ccedil;o do ano que passou - e tamb&eacute;m da vida.<br /> <br /> Sei bem o quanto nos custa, como mulheres, cada conquista. E tamb&eacute;m o quanto ainda temos para conquistar, apenas para nos equipararmos em direitos a nossos pares masculinos. A batalha di&aacute;ria &eacute; mesmo &aacute;rdua, mas estou longe de encampar slogans como &quot;o homem &eacute; uma f&ecirc;mea imperfeita&quot;, por exemplo. Elizabeth Gould Davis, a c&eacute;lebre autora do tamb&eacute;m c&eacute;lebre O Primeiro Sexo, tem import&acirc;ncia fundamental na luta feminista, com certeza, mas nossos inimigos, creio, n&atilde;o s&atilde;o os homens.<br /> <br /> O que temos de mudar (ali&aacute;s, isso j&aacute; deveria ter acontecido) &eacute; a consci&ecirc;ncia da pr&oacute;pria mulher, consci&ecirc;ncia de que pode ser o que quiser, escolher o pr&oacute;prio caminho, ser feliz consigo mesma. Esse talvez seja o maior desafio, porque estamos lidando com a autoestima, t&atilde;o minada atrav&eacute;s dos s&eacute;culos.<br /> <br /> Claro, n&atilde;o podemos dizer que nada mudou nos &uacute;ltimos anos. Hoje &eacute; poss&iacute;vel detectar uma s&eacute;rie de evolu&ccedil;&otilde;es na vida das brasileiras. Basta lembrarmos da Lei Maria da Penha, de 2006, que j&aacute; salvou a vida de milhares de mulheres desde ent&atilde;o (e que precisa ser ainda mais intransigente no combate &agrave; viol&ecirc;ncia dom&eacute;stica); e tamb&eacute;m da mais recente lei que fez do feminic&iacute;dio um crime qualificado de homic&iacute;dio, com pena de 12 a 30 anos, e o incluiu no rol dos crimes hediondos, em 2015.<br /> <br /> S&atilde;o a&ccedil;&otilde;es essenciais como essas que devemos comemorar, assim como cada polegada conquistada no decorrer dos anos.<br /> <br /> Mas tamb&eacute;m precisamos investir mais tempo e dedica&ccedil;&atilde;o a uma quest&atilde;o que n&atilde;o poderia (ainda) ser tema pol&ecirc;mico, a estampar capas de revista ou editoriais de jornais mundo afora. Refiro-me ao atual est&aacute;gio da desigualdade salarial nas empresas. Segundo o F&oacute;rum Econ&ocirc;mico Mundial, em um progn&oacute;stico que considero bastante perturbador, a remunera&ccedil;&atilde;o de homens e mulheres que ocupam o mesmo cargo s&oacute; ser&aacute; a mesma em... 2095.<br /> <br /> N&atilde;o sei voc&ecirc;, leitora, mas n&atilde;o gosto da op&ccedil;&atilde;o de ter de viver mais 77 anos (na esperan&ccedil;a, muito reduzida, de ainda estar por aqui palpitando) para finalmente ver transformado em realidade um cen&aacute;rio que n&atilde;o faz sentido j&aacute; nos dias atuais.<br /> <br /> Afinal, j&aacute; h&aacute; exemplos importantes no mundo de que &eacute; poss&iacute;vel, sim, superar essa barreira. O mais impressionante &eacute; o da Isl&acirc;ndia, onde, desde o in&iacute;cio de 2018, vigora uma lei pioneira que obriga as empresas a pagarem sal&aacute;rios iguais a homens e mulheres no desempenho das mesmas fun&ccedil;&otilde;es.<br /> <br /> De acordo com a lei, que foi aprovada em junho do ano passado e entrou em vigor em janeiro de 2018, todas as empresas com mais de 25 funcion&aacute;rios ter&atilde;o de provar que n&atilde;o praticam diferen&ccedil;as salariais de g&ecirc;nero.<br /> <br /> Na Alemanha, onde a disparidade salarial entre homens e mulheres bate os 20% - valor id&ecirc;ntico na &Aacute;ustria e na Hungria, com a Est&ocirc;nia em estratosf&eacute;ricos 30% e a Eslov&ecirc;nia com a melhor performance da UE, com 10% -, uma nova lei tamb&eacute;m j&aacute; obriga as empresas a informarem suas funcion&aacute;rias sobre o sal&aacute;rio de seus colegas homens em cargos id&ecirc;nticos. Uma saia-justa muito bem-vinda.<br /> <br /> No Reino Unido, as empresas com mais de 250 trabalhadores t&ecirc;m, a partir deste ano, de tornar p&uacute;blicas as desigualdades salariais. E, na Espanha, trava-se uma batalha parlamentar por uma lei que obrigue a essa mesma transpar&ecirc;ncia.<br /> <br /> Em qualquer latitude, &eacute; quest&atilde;o, pura e simples, de se fazer justi&ccedil;a. Levando-se em considera&ccedil;&atilde;o que, no Brasil, as mulheres s&atilde;o maioria em cursos de gradua&ccedil;&atilde;o, mestrado e doutorado desde o come&ccedil;o desta d&eacute;cada (de acordo com dados recentes do Capes), creio que podemos cobrar, j&aacute; na pr&oacute;xima d&eacute;cada, a invers&atilde;o da balan&ccedil;a de empregos entre eles e elas.<br /> <br /> As mulheres, no mundo inteiro, est&atilde;o cada vez mais preparadas, intelectual e emocionalmente, para alcan&ccedil;ar o sucesso pessoal e profissional - isso &eacute; um fato. O exemplo mais ins&oacute;lito talvez seja a Universidade de Oxford, que, em 2017, admitiu mais mulheres do que homens em seus cursos de gradua&ccedil;&atilde;o pela primeira vez em seus mais de 800 anos de exist&ecirc;ncia.<br /> <br /> Ent&atilde;o, por que as mulheres continuam a receber menos? No Brasil, elas ganham cerca de 75% do sal&aacute;rio dos homens na mesma fun&ccedil;&atilde;o. S&atilde;o n&uacute;meros do Pnad, que mudaram muito pouco nos &uacute;ltimos anos.<br /> <br /> N&atilde;o, n&atilde;o vou citar a badalada capacidade multifuncional das mulheres, nem a t&atilde;o festejada sensibilidade feminina. Isso n&atilde;o significa que estou negando as duas qualidades, muito pelo contr&aacute;rio, s&oacute; n&atilde;o acho que &eacute; preciso enaltecer caracter&iacute;sticas inatas para provar que merecemos o que h&aacute; muito j&aacute; fazemos por merecer.<br /> <br /> N&atilde;o somos melhores do que ningu&eacute;m e n&atilde;o deve ser esse o objeto da discuss&atilde;o. O que queremos &eacute;, apenas, respeito pela verdade dos fatos, pela verdade que estamos escrevendo h&aacute; d&eacute;cadas.<br /> <br /> Como diria Gloria Steinem, famosa jornalista e ativista pelos direitos femininos, &quot;a verdade te libertar&aacute;, mas, primeiro, ela vai te enfurecer&quot;. &Eacute; preciso buscar essa liberdade todos os dias, evitando apenas que a f&uacute;ria bloqueie a nossa capacidade de a&ccedil;&atilde;o e rea&ccedil;&atilde;o.<br /> <br /> <div style="margin-left: 40px;"><b>Um feliz Dia Internacional da Mulher para todas n&oacute;s! </b><br /> &nbsp;</div> <b><i>Paula Paschoal</i></b> &eacute; diretora geral do PayPal Brasil. A empresa, com sede em San Jose, na Calif&oacute;rnia, estabeleceu, em 2016, que mulheres e homens em cargos id&ecirc;nticos recebam o mesmo sal&aacute;rio. <br />