Lições da pobreza dos outros

02 de maio de 2018 às 16:31

José Pio Martins
Em 2004, circulou um pol&ecirc;mico relat&oacute;rio feito pelo F&oacute;rum Econ&ocirc;mico Mundial com a afirma&ccedil;&atilde;o de que a estagna&ccedil;&atilde;o da &Aacute;frica foi a maior trag&eacute;dia econ&ocirc;mica do s&eacute;culo 20. O documento foi assinado por Elsa V. Artadi, da Universidade Harvard, e Xavier Sala-i-Martin, de Columbia, e trazia uma informa&ccedil;&atilde;o intrigante: em 1970, a &Aacute;frica abrigava 10% dos pobres do mundo; em 2000, essa taxa era de quase 50%. O crescimento econ&ocirc;mico foi t&atilde;o reduzido que a maioria dos pa&iacute;ses ao sul do Saara estava em condi&ccedil;&otilde;es piores do que na &eacute;poca em que eles se tornaram independentes.<br /> <br /> O relat&oacute;rio atribu&iacute;a o fracasso africano aos seguintes fatores: conflitos militares; corrup&ccedil;&atilde;o; desprezo pela lei; pol&iacute;ticas fiscais indisciplinadas; infraestrutura prec&aacute;ria; e baixo investimento em capital f&iacute;sico. E os autores declaravam: &ldquo;N&atilde;o deve haver d&uacute;vida de que o maior desastre econ&ocirc;mico do s&eacute;culo 20 &eacute; a performance deprimente do crescimento no continente africano&rdquo;. O que isso tem a ver com o Brasil? Afora conflitos militares, todos os demais fatores causantes do fracasso africano est&atilde;o presentes em nosso pa&iacute;s.<br /> <br /> Eis a&iacute; um card&aacute;pio de ingredientes que o Brasil deve combater a todo custo, sob pena de n&atilde;o superar a pobreza e o atraso. O Congresso Nacional, com 513 deputados e 81 senadores, deveria ser o foro adequado para debates inteligentes e avan&ccedil;ados sobre os problemas nacionais, sobre o que est&aacute; errado e quais reformas devem ser feitas para impedir que o pa&iacute;s caia na s&iacute;ndrome do fracasso africano. O diagn&oacute;stico feito pelo relat&oacute;rio referido pode nos ensinar valiosas li&ccedil;&otilde;es sobre o fracasso da &Aacute;frica e quais os caminhos para n&atilde;o incorrermos nos mesmos erros.<br /> <br /> Infelizmente, o Congresso Nacional tornou-se um valhacouto de mediocridades intelectuais e parlamentares desaparelhados para a discuss&atilde;o inteligente dos grandes temas nacionais. Um homem sem cultura e de parcos conhecimentos pouco tem a contribuir em uma discuss&atilde;o complexa na casa de leis. N&atilde;o conseguido a grandeza, o Congresso fica reduzido a quest&otilde;es pequenas e comezinhas.<br /> <br /> Desnecess&aacute;rio dizer que h&aacute; pol&iacute;ticos de alto n&iacute;vel, capazes de um di&aacute;logo com sabedoria. Mas esses, convenhamos, s&atilde;o t&atilde;o poucos que eles somem no oceano de mediocridades. N&atilde;o tem sido por outra raz&atilde;o que as quest&otilde;es relevantes votadas no parlamento tenham origem no Poder Executivo. Se um relat&oacute;rio de alto n&iacute;vel como esse do F&oacute;rum Econ&ocirc;mico Mundial, rico em informa&ccedil;&otilde;es sobre as desgra&ccedil;as de um continente inteiro, &eacute; ignorado pelas elites pol&iacute;ticas no poder mesmo sabendo que, em sua maioria, essas causas est&atilde;o presentes no Brasil, a conclus&atilde;o &eacute; de que a maior parte dos parlamentares n&atilde;o tem cultura e conhecimento para tratar de temas complexos.<br /> <br /> O Brasil tem as principais condi&ccedil;&otilde;es para ser um pa&iacute;s rico e com bom padr&atilde;o de vida. Mas a apatia e a in&eacute;rcia, inclusive de boa parte dos intelectuais, diante das graves quest&otilde;es nacionais podem condenar o pa&iacute;s a permanecer na pobreza e no atraso. O detalhamento do que aconteceu com o continente africano e a identifica&ccedil;&atilde;o das causas comp&otilde;em um material de alta utilidade para a compreens&atilde;o dos problemas e das pol&iacute;ticas fundamentais para a supera&ccedil;&atilde;o do atraso e da pobreza. &Eacute; lament&aacute;vel que n&atilde;o utilizemos esse material a nosso favor.<br /> <br /> Durante d&eacute;cadas, vingaram teses afirmando que h&aacute; pa&iacute;ses ricos porque outros s&atilde;o pobres. Na Am&eacute;rica Latina, a cantilena entre os pol&iacute;ticos era a de que somos pobres porque os Estados Unidos s&atilde;o ricos. Atualmente se sabe que isso &eacute; uma bobagem monumental, e gastamos tempo demais culpando inimigos externos por nossos equ&iacute;vocos e nossa incapacidade de entregar a nossos filhos um pa&iacute;s sem pobreza e sem mis&eacute;ria.<br /> &nbsp;<br /> <b><i><img src="/uploads/image/artigos_jose-pio-martins_ economista-reitor-up_.jpg" width="60" hspace="3" height="80" align="left" alt="" /><br /> <br /> <br /> Jos&eacute; Pio Martins</i></b>, economista, &eacute; reitor da Universidade Positivo.<br />