O VULCÃO SOCIAL

20 de junho de 2018 às 17:13

Gaudêncio Torquato,
Os geof&iacute;sicos ensinam que a fus&atilde;o de rochas com materiais vol&aacute;teis, quando submetidas a uma temperatura que pode chegar aos 1500&ordm; C, resulta em magma, subst&acirc;ncia existente no interior da terra em uma profundidade entre 15 a 1500 kms. Nas &uacute;ltimas semanas, nossos olhos contemplaram essa massa avermelhada saindo de um vulc&atilde;o na Guatemala, na Am&eacute;rica Central, correndo por encostas, cobrindo cidades de fogo e cinzas, devastando paisagens e deixando um grande saldo de mortos e desaparecidos.<br /> <br /> A imagem da erup&ccedil;&atilde;o vulc&acirc;nica nos remete a uma leve sensa&ccedil;&atilde;o de conforto pelo fato de o Brasil n&atilde;o ter vulc&otilde;es em atividade, o que n&atilde;o significa que estamos imunes &agrave;s desgra&ccedil;as com origem noutros fatores. Nossa cultura pol&iacute;tica, por exemplo, &eacute; fonte de desvios e curvas que acabam tirando o pa&iacute;s de seu rumo civilizat&oacute;rio. Nem bem sa&iacute;mos da pior recess&atilde;o da hist&oacute;ria, sob acolhedora sombra de reformas que prometiam recolocar o trem nos trilhos e resgatar a credibilidade do pa&iacute;s, eis que o pessimismo volta a abater o &acirc;nimo nacional.<br /> <br /> Apesar do alerta do ex-presidente Fernando Henrique (em seus tempos de mando) de que &ldquo;n&atilde;o podemos cair no catastrofismo&rdquo;, o futuro &eacute; nebuloso e t&atilde;o cheio de interroga&ccedil;&otilde;es que n&atilde;o h&aacute; como escapar &agrave; ideia de magmas em forma&ccedil;&atilde;o subindo &agrave; superf&iacute;cie do nosso territ&oacute;rio para explodir na erup&ccedil;&atilde;o de um vulc&atilde;o social, caso se eleja no pleito deste ano um perfil de extrema direita ou um de extrema esquerda. A sugest&atilde;o do pr&oacute;prio FHC de se arrumar consenso em torno de Marina Silva (Rede Sustentabilidade) n&atilde;o resiste &agrave; evidente infer&ecirc;ncia de que essa figura pacata e moderada n&atilde;o re&uacute;ne condi&ccedil;&otilde;es para enfrentar a real politik. Seria tragada por intermitente tuf&atilde;o pol&iacute;tico.<br /> <br /> Voltemos aos extremos. O esp&iacute;rito beligerante de Jair Bolsonaro, caso o capit&atilde;o seja eleito, levaria o pa&iacute;s para uma posi&ccedil;&atilde;o de continuados conflitos. Estabeleceria, de imediato, a disputa de &ldquo;cabo-de-guerra&rdquo; entre militantes, multiplicando arengas e querelas, expandindo posi&ccedil;&otilde;es radicais, e envolvendo classes sociais, levadas a tomar partido diante de confrontos nas ruas e nas casas congressuais. A ingovernabilidade ganharia corpo. O clima social ficaria sob a amea&ccedil;a de um rastilho de p&oacute;lvora. Que os bolsonarianos gostariam de jogar aos montes para acender o pavio. O vulc&atilde;o entraria em erup&ccedil;&atilde;o diante de gestos tresloucados do governante.<br /> <br /> Do outro lado, eventual perfil representando a extrema esquerda e correntes de esquerda refor&ccedil;aria o refr&atilde;o do apartheid social, &ldquo;n&oacute;s e eles&rdquo;, que o PT continua a brandir em v&iacute;deos, mensagens pelas redes, express&otilde;es de seus porta-vozes &ndash; Lula, Gleisi, Lindberg Faria, entre os principais. Para montar firme na sela do cavalo, o eleito n&atilde;o deixaria brechas: encheria os tanques da m&aacute;quina governamental com radicais e enfiaria o Estado na estrutura partid&aacute;ria. Todos os cantinhos seriam ocupados. Projeto de poder de 20 anos, com juros e corre&ccedil;&atilde;o monet&aacute;ria cobrados do impeachment de Dilma. Em suma, ter&iacute;amos amarra&ccedil;&atilde;o da sociedade ao Estado forte.<br /> <br /> O pa&iacute;s est&aacute; dividido. E a hip&oacute;tese de harmonia social n&atilde;o passa de lorota quando expressa por figuras das extremidades do arco ideol&oacute;gico. O que se v&ecirc; na farta linguagem de militantes nas redes sociais &eacute; a destila&ccedil;&atilde;o de &oacute;dio, inf&acirc;mias, acusa&ccedil;&otilde;es pesadas, falsidades e enaltecimento &agrave;s ditaduras. O Brasil volta a sofrer a s&iacute;ndrome de S&iacute;sifo, o condenado pelos deuses a depositar a pedra no cume da montanha, tarefa que tenta executar por toda a eternidade. <br /> &nbsp;<br /> <b><i><img src="/uploads/image/artigos_gaudencio-torquato_jornalista-professor-usp-consultor-politico.jpg" width="60" hspace="3" height="80" align="left" alt="" /><br /> <br /> Gaud&ecirc;ncio Torquato</i></b>, jornalista, &eacute; professor titular da USP, consultor pol&iacute;tico e de comunica&ccedil;&atilde;o Twitter@gaudtorquato