INGOVERNABILIDADE À VISTA

06 de outubro de 2018 às 10:28

Tenente Dirceu Cardoso Gon&cce
&ldquo;Nenhum homem pode banhar-se duas vezes no mesmo rio, pois na segunda vez o rio j&aacute; n&atilde;o &eacute; o mesmo, tampouco o homem&rdquo;. Nada mais adequado de que o conhecido pensamento de Her&aacute;clito de &Eacute;feso (535 a.C. a 475 a.C) para lembrar ao candidato do PT &agrave; presid&ecirc;ncia da Rep&uacute;blica, Fernando Haddad, de que os bons tempos do primeiro mandato do presidente Lula (2002-2006) n&atilde;o voltar&atilde;o. As &aacute;guas do rio, hoje, s&atilde;o bem diferentes. A felicidade que promete ao povo n&atilde;o passa de mais uma quimera.<br /> <br /> O pa&iacute;s ainda sofre os efeitos da maior recess&atilde;o econ&ocirc;mica de sua hist&oacute;ria, fruto do desgoverno da ex-presidente Dilma. Lembrando um pouco: o desemprego subiu de 5,30% para 11,5% (12, 3 milh&otilde;es), a infla&ccedil;&atilde;o saltou de 5,90% para 9,28%, o PIB partiu de um crescimento de 7,53% ao ano para uma retra&ccedil;&atilde;o de 3,90% ao ano, a d&iacute;vida interna aumentou em mais de 70% e algumas das maiores empresas tiveram perda expressiva de valor de mercado, como a Vale, com queda de 63,45% no valor da a&ccedil;&atilde;o, e a Petrobr&aacute;s, com recuo de 55,85% na cota&ccedil;&atilde;o do papel.<br /> <br /> Em vez de garantir que o Brasil pode &ldquo;voltar a ser feliz&rdquo;, o ex-prefeito de S&atilde;o Paulo deveria dizer, caso eleito, como governaria um pa&iacute;s dividido entre &ldquo;n&oacute;s e eles&rdquo;, a ala do PT com seus mocinhos, e a ala dos advers&aacute;rios, povoada de bandidos. Pelo que se conhece, a ala que prega a dualidade &eacute; majorit&aacute;ria na sigla. E n&atilde;o abandonar&aacute; a oportunidade para dar o troco nos &ldquo;golpistas&rdquo;, como chama todos aqueles que aprovaram o impeachment de Rousseff.<br /> <br /> Da mesma forma, o capit&atilde;o Jair Bolsonaro, candidato do PSL &agrave; presid&ecirc;ncia, deveria tentar mostrar como governaria um pa&iacute;s rachado ao meio sob a sombra de uma identidade profundamente impregnada de conservadorismo e de uma hist&oacute;ria pontilhada de manifesta&ccedil;&otilde;es de racismo, homofobia e misoginia. Mais: que papel ter&atilde;o as For&ccedil;as Armadas em seu governo, sabendo-se da defesa que faz dos anos de chumbo e do aceno a militares, com os quais quer compartilhar a administra&ccedil;&atilde;o. <br /> <br /> O fato &eacute; que a ingovernabilidade paira sobre o pr&oacute;ximo ciclo governamental, qual seja o vitorioso, um dos dois, como &eacute; mais prov&aacute;vel. O Brasil &eacute; muito diferente do territ&oacute;rio governado por Lula, a partir de 2002. As condi&ccedil;&otilde;es internacionais s&atilde;o tamb&eacute;m bem diferentes. E, como se sabe, a governabilidade de uma Na&ccedil;&atilde;o &eacute; tamb&eacute;m resultante da geopol&iacute;tica mundial, principalmente nesse ciclo de contundentes batalhas comerciais e teias protecionistas, envolvendo Estados Unidos, China e pa&iacute;ses europeus.&nbsp;&nbsp;&nbsp;&nbsp;&nbsp;&nbsp; <br /> <br /> Se o PT voltar ao centro do poder, com Haddad na cadeira presidencial, abrir&aacute; largas fissuras nas alas que abriga, a partir dos componentes &ldquo;duros&rdquo; do partido, como a presidente Gleisi Hoffman, vestindo a nova roupa de deputada e liderando o movimento pelo indulto ao presidente Luiz In&aacute;cio. O pr&oacute;prio poder&aacute; n&atilde;o desejar a liberdade sob o perd&atilde;o presidencial, mas o fato &eacute; que sua figura estar&aacute; no centro dos rumos petistas. A ala que prega mudan&ccedil;as no petismo, at&eacute; sinalizando com a renova&ccedil;&atilde;o partid&aacute;ria e desenhando um tra&ccedil;ado p&oacute;s-Lula, insistir&aacute; em sua posi&ccedil;&atilde;o.&nbsp; <br /> <br /> N&atilde;o ser&aacute; f&aacute;cil a um eventual governo do PT passar uma borracha em projetos e linhas program&aacute;ticas fixadas na administra&ccedil;&atilde;o anterior. Veja-se o caso da reforma trabalhista. Revogar essa lei exigir&aacute; intensa articula&ccedil;&atilde;o com deputados e senadores. Para mudar proposi&ccedil;&otilde;es, o novo governo teria de fazer amplas concess&otilde;es aos corpos parlamentares. Que cobrar&atilde;o do presidente largos nacos de poder. Os pol&iacute;ticos brasileiros s&atilde;o pragm&aacute;ticos. N&atilde;o agem sob o lume das ideologias.<br /> <br /> De sua parte, o capit&atilde;o Bolsonaro, cujo porte &eacute; bem menor do que exige o comando da 9&ordf; economia do mundo, teria de fazer intenso cursinho de articula&ccedil;&atilde;o para negociar com seus pares na C&acirc;mara, onde passou anos habitando espa&ccedil;os do &ldquo;baixo clero&rdquo;, e junto ao Senado. Seu guru na economia, mesmo sob as b&ecirc;n&ccedil;&atilde;os do mercado, enfrentaria resist&ecirc;ncias para aplicar sua vis&atilde;o ultraliberal (&ldquo;privatiza tudo&rdquo;), devendo se submeter &agrave;s correntes progressistas das casas parlamentares.<br /> <br /> Mais feia ser&aacute; a paisagem social, onde milit&acirc;ncias bolsonarianas e petistas tendem a partir para o confronto, n&atilde;o sendo improv&aacute;veis rastros de sangue em algumas pra&ccedil;as de guerra. O apaziguamento social s&oacute; ocorreria&nbsp;&nbsp; com a volta do emprego e melhoria do bem-estar social. Moldura que demora para ser montada.<br /> <br /> Haddad ou Bolsonaro, cada qual a seu modo, ter&aacute; de enfrentar o desafio:&nbsp; unir as bandas de um pa&iacute;s conflagrado por b&iacute;lis, &oacute;dio e desejo de vingan&ccedil;a.<br /> &nbsp;<br /> <img src="/uploads/image/artigos_gaudencio-torquato_jornalista-professor-usp-consultor-politico.jpg" width="60" hspace="3" height="80" align="left" alt="" /><br /> <br /> <br /> <b><i>Gaud&ecirc;ncio Torquato,</i></b> jornalista, &eacute; professor titular da USP, consultor pol&iacute;tico e de comunica&ccedil;&atilde;o Twitter@gaudtorquato<br />