Brasil e Totalitarismo

26 de outubro de 2018 às 17:35

Leonardo Torres
A palavra das &uacute;ltimas semanas foi viol&ecirc;ncia. Os jornais est&atilde;o noticiando agress&otilde;es por todo o Brasil. Nas redes sociais, v&iacute;deos est&atilde;o sendo divulgados registrando discuss&otilde;es, brigas, espancamentos e mortes. O pa&iacute;s que sempre se vangloriou de sua cordialidade, diversidade, alegria e amor, tornou-se o pa&iacute;s do &oacute;dio e da viol&ecirc;ncia.<br /> <br /> De que lado o &oacute;dio est&aacute;? Da esquerda ou da direita? Exclusivamente, de nenhum dos dois. O &oacute;dio est&aacute; do lado do totalitarismo. Infelizmente, a motiva&ccedil;&atilde;o da facada que fez de v&iacute;tima Jair Bolsonaro foi a mesma motiva&ccedil;&atilde;o que matou um mestre de capoeira, em Salvador.<br /> <br /> O &oacute;dio, nesses &uacute;ltimos anos, tem sido gestado na alma do brasileiro, sendo alimentado pela ang&uacute;stia de um pa&iacute;s cindido, de direitos perdidos, de educa&ccedil;&atilde;o e sa&uacute;de prec&aacute;rias, de corrup&ccedil;&atilde;o generalizada e de uma m&iacute;dia que mais confunde do que informa. Tudo isso gerou, sem d&uacute;vidas, uma crise plural: social, pol&iacute;tica, mental, ambiental, etc.. Crise essa que &eacute; muito similar ao per&iacute;odo alem&atilde;o que precedeu o Nazismo. Na Hist&oacute;ria, vimos que o &oacute;dio, seja de qualquer povo, quando gestado, tem que escapar de alguma forma. E, na maioria das vezes, os povos elegem a forma mais primitiva e sombria para esse escape: a viol&ecirc;ncia.<br /> <br /> Hannah Arendt, grande estudiosa do totalitarismo, aponta que o embri&atilde;o desse movimento &eacute; o isolamento dos indiv&iacute;duos, ou seja, deixar todos contra todos &ndash; de fato, cindir a popula&ccedil;&atilde;o. E ent&atilde;o, fazer o povo crer em uma bipolaridade do que &eacute; verdadeiro e do que &eacute; falso. Do que &eacute; real e do que &eacute; irreal. De quem &eacute; o her&oacute;i e de quem &eacute; o inimigo. Essa din&acirc;mica, muito recorrente em nossos antepassados, n&atilde;o &eacute; algo dif&iacute;cil de ser aderida pela popula&ccedil;&atilde;o, pois ela &eacute; simples, n&atilde;o &eacute; preciso pensar muito, nem estudar, nem se aprofundar. &Eacute; algo dado. E parece ser mais atual do que nunca em nosso pa&iacute;s. <br /> No Brasil, existe a din&acirc;mica &ldquo;pai-her&oacute;i contra o mal&rdquo;. Somos um pa&iacute;s que possui a alma do &oacute;rf&atilde;o ferido. N&atilde;o temos um fundador ou her&oacute;i da na&ccedil;&atilde;o na Hist&oacute;ria, tentaram enxergar o pai-her&oacute;i em Tiradentes, em Vargas, nos militares, em Collor, em Lula, em Moro (pediram at&eacute; que ele se candidatasse) e, agora, em Jair Bolsonaro. Curiosamente, n&atilde;o &eacute; &agrave; toa o n&uacute;mero de filhos que n&atilde;o tem o nome do pai em suas certid&otilde;es de nascimento. <br /> <br /> Nessa polariza&ccedil;&atilde;o, considerar um como pai-her&oacute;i &eacute; imputar no outro todo o mal existente. Essa &eacute; a din&acirc;mica do bode expiat&oacute;rio, estudada por Rene Girard, cuja finalidade &eacute; a conten&ccedil;&atilde;o das tens&otilde;es sociais pelo derramamento de sangue, pela viol&ecirc;ncia. Portanto, &eacute; necess&aacute;rio ponderar a exalta&ccedil;&atilde;o de um ou outro candidato, principalmente quando ele promete resolver os problemas de forma r&aacute;pida e pr&aacute;tica.<br /> <br /> Nossa recente pesquisa sobre cont&aacute;gio ps&iacute;quico demonstra que uma parte da comunica&ccedil;&atilde;o humana n&atilde;o se d&aacute; somente pela linguagem, mas tamb&eacute;m pelas emo&ccedil;&otilde;es, sejam ben&eacute;ficas ou mal&eacute;ficas. E, assim como a comunica&ccedil;&atilde;o, o cont&aacute;gio ps&iacute;quico &eacute; um dos formadores dos pensamentos e julgamentos de uma sociedade. O &oacute;dio &eacute; uma emo&ccedil;&atilde;o, portanto, &eacute; contagioso. Ele n&atilde;o passa pelo crivo da racionalidade, ele est&aacute; aqu&eacute;m dela. Ele &eacute; irracional e inconsciente, e isso d&aacute; as bases para o isolamento e para a bipolaridade vividos hoje. De certa forma, o &oacute;dio est&aacute; na alma.<br /> <br /> Apesar de termos percebido agora, &eacute; responsabilidade nossa tudo o que est&aacute; sendo gestado em nossas almas, consciente ou inconscientemente. Resta-nos escolher se vamos ou n&atilde;o nos contagiar por essas emo&ccedil;&otilde;es. <br /> <br /> <b><i>Leonardo Torres</i></b>, 28 anos, doutorando e mestre em Comunica&ccedil;&atilde;o e Cultura Midi&aacute;tica, palestrante e professor universit&aacute;rio