Política externa de Jair Bolsonaro – o que esperar

29 de outubro de 2018 às 17:00

Zilda Mendes
Presidente eleito. Agora &eacute; poss&iacute;vel imaginar o que se pode esperar do novo governo no que diz respeito &agrave; politica externa. &Eacute; sabido que este tema n&atilde;o foi suficientemente discutido durante as campanhas eleitorais, mas o que foi dito e o que ainda se diz, somado &agrave;s pretens&otilde;es apresentadas no plano de governo do PSL, j&aacute; nos d&aacute; uma no&ccedil;&atilde;o dos desafios que dever&atilde;o ser enfrentados pelo novo governante. <br /> <br /> Pelo que est&aacute; escrito no plano de governo de Bolsonaro, registrado no TSE, e mesmo o que foi dito nos debates e outros meios utilizados para se expressar quando ainda candidato, n&atilde;o se pode saber em detalhes quais medidas ser&atilde;o efetivamente adotadas e quais ser&atilde;o as suas prioridades.<br /> <br /> Sua ideia de manter o Banco Central &quot;formal e politicamente independente&quot; alinhado ao Minist&eacute;rio da Economia, a ser criado em substitui&ccedil;&atilde;o dos Minist&eacute;rios da Fazenda, do Planejamento, da Ind&uacute;stria e Com&eacute;rcio Exterior e Servi&ccedil;os e da Secretaria Executiva do PPI - Programa de Parcerias de Investimentos, est&aacute; sendo bem vista por parte do quadro do governo. Por outro lado, em nota divulgada em 22 de outubro passado, a CNI defende a manuten&ccedil;&atilde;o do MDIC, alegando que, devido &agrave;s especificidades das pastas, os minist&eacute;rios da Fazenda e do Planejamento desempenham pap&eacute;is diferentes daqueles desempenhados pelo minist&eacute;rio do Desenvolvimento, Ind&uacute;stria, Com&eacute;rcio Exterior e Servi&ccedil;os, que &eacute; o de executar e coordenar as pol&iacute;ticas p&uacute;blicas para as ind&uacute;strias.<br /> <br /> Embora n&atilde;o constem de seu plano de governo, declara&ccedil;&otilde;es sobre pol&iacute;tica externa foram feitas em entrevistas para redes de televis&atilde;o e jornais, como a cr&iacute;tica que fez ao Comit&ecirc; de Direitos Humanos da ONU quando este comit&ecirc; defendeu a candidatura do ex-presidente Lula. Suas refer&ecirc;ncias ao Acordo de Paris, assinado por 195 pa&iacute;ses, inclusive o Brasil, que se comprometeram a reduzir as emiss&otilde;es de gases de efeito estufa, sofreram cr&iacute;ticas, mas &agrave;s v&eacute;speras do segundo turno explicou-se mais claramente quais as condi&ccedil;&otilde;es que poderiam levar o pa&iacute;s a sair deste acordo. S&atilde;o aqueles ajustes nas falas diante das manifesta&ccedil;&otilde;es n&atilde;o s&oacute; populares, mas de institui&ccedil;&otilde;es que se sentem atingidas.<br /> <br /> Outra decis&atilde;o, que parece irrevers&iacute;vel, &eacute; a promessa de extraditar o italiano Cesare Battisti, condenado por assassinatos na It&aacute;lia, cujo pedido de extradi&ccedil;&atilde;o feito pelo governo italiano foi negado pelo ex-presidente Lula, pois o considera preso pol&iacute;tico.<br /> Pelos elogios que o presidente eleito faz &agrave; posi&ccedil;&atilde;o nacionalista do presidente dos Estados Unidos e pelas promessas de repensar as rela&ccedil;&otilde;es do Brasil com o Mercosul e os Brics, sua pol&iacute;tica externa vai totalmente em desencontro com a adotada pelos governos petistas. &Eacute; favor&aacute;vel &agrave; destitui&ccedil;&atilde;o do poder de Nicol&aacute;s Maduro na Venezuela e que o Brasil deve se afastar daquele pa&iacute;s, mostrando-se disposto a fortalecer as rela&ccedil;&otilde;es com pa&iacute;ses da Am&eacute;rica Latina &quot;livres de ditaduras&quot;. E em rela&ccedil;&atilde;o aos imigrantes venezuelanos, sua proposta &eacute; a cria&ccedil;&atilde;o de um campo de refugiados para acolh&ecirc;-los.<br /> <br /> Diz ainda que pretende intensificar a aproxima&ccedil;&atilde;o com os Estados Unidos, Israel e Taiwan, mas por outro lado n&atilde;o reconhece a Palestina como um pa&iacute;s. Seria bom recordar que o Brasil reconheceu a Palestina como pa&iacute;s desde 2010, inclusive h&aacute; um acordo comercial Mercosul-Palestina do qual o Brasil &eacute; parte, embora ainda n&atilde;o esteja em vigor.<br /> <br /> Quanto aos investimentos chineses no Brasil, demonstra certa preocupa&ccedil;&atilde;o, indicando que pode fazer restri&ccedil;&otilde;es. Para Bolsonaro, a venda de empresas brasileiras para os chineses significa &quot;estatizar para a China&quot;. Em diversas ocasi&otilde;es deixa claro que &quot;temos, sim, de procurar fazer parcerias com todos os pa&iacute;ses, mas sem abrir m&atilde;o de nossa soberania&quot; e, reafirma que, se poss&iacute;vel, &quot;vamos fazer com que comprem no Brasil, n&atilde;o comprem o Brasil&quot;.<br /> <br /> Ainda sobre o com&eacute;rcio exterior, seu plano de governo prop&otilde;e a redu&ccedil;&atilde;o de al&iacute;quotas de importa&ccedil;&atilde;o e das barreiras n&atilde;o tarif&aacute;rias e, paralelamente, constituir novos acordos bilaterais no que for poss&iacute;vel. Pensa ainda em buscar &quot;uma nova forma de fazer com&eacute;rcio com toda a Am&eacute;rica do Sul, sem vi&eacute;s ideol&oacute;gico&quot;.<br /> <br /> Agora &eacute; o momento de vermos e acompanharmos o que de fato ser&aacute; feito em rela&ccedil;&atilde;o &agrave; pol&iacute;tica externa brasileira. Muitos ajustes do pouco do que foi dito dever&atilde;o ser feitos, mas a certeza que temos &eacute; que o presidente eleito Bolsonaro n&atilde;o encontrar&aacute; um mundo f&aacute;cil com o qual se relacionar, n&atilde;o s&oacute; pelas incertezas pol&iacute;ticas que pairam em boa parte do planeta e pelas vulnerabilidades econ&ocirc;micas dos pa&iacute;ses em desenvolvimento, mas tamb&eacute;m pelas rea&ccedil;&otilde;es e an&aacute;lises negativas de parte da imprensa internacional em rela&ccedil;&atilde;o &agrave;s suas ideias e comportamentos.<br /> <br /> <i><b>Zilda Mendes</b></i> &eacute; professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie e atua nas &aacute;reas de com&eacute;rcio exterior e c&acirc;mbio.