O que o governo não é

05 de novembro de 2018 às 12:07

José Pio Martins
&quot;Para come&ccedil;ar, o governo n&atilde;o deve agir como um fabricante de flores, mas como um jardineiro cuja fun&ccedil;&atilde;o &eacute; criar o ambiente para que as flores nas&ccedil;am e cres&ccedil;am bonitas e saud&aacute;veis. No plano interno, o pa&iacute;s tem tr&ecirc;s entidades econ&ocirc;micas: pessoas, empresas e governo. Quem produz e gera riqueza (no sentido de bens e servi&ccedil;os &uacute;teis e consum&iacute;veis) s&atilde;o as pessoas e as empresas. Para a execu&ccedil;&atilde;o de bens coletivos e servi&ccedil;os p&uacute;blicos, a sociedade constitui um condom&iacute;nio (o governo) e elege um s&iacute;ndico (o governante).<br /> <br /> A primeira li&ccedil;&atilde;o em economia &eacute;: o governo n&atilde;o d&aacute; nada &agrave; sociedade que dela n&atilde;o tenha tirado. Quando gasta mais do que os recursos arrecadados em tributos, ele tem de tomar empr&eacute;stimos nos bancos, cujos fundos dispon&iacute;veis s&atilde;o os dep&oacute;sitos e aplica&ccedil;&otilde;es feitos por... pessoas e empresas. O governo n&atilde;o tem recursos pr&oacute;prios para gastar, apenas os recursos que lhe s&atilde;o entregues pelas pessoas e pelas empresas. Nestas elei&ccedil;&otilde;es andaram dizendo que o crescimento somente &eacute; poss&iacute;vel pelo aumento dos investimentos p&uacute;blicos. Em parte, &eacute; verdade. Mas, a pergunta &eacute;: de onde vir&atilde;o os recursos?<br /> <br /> Como o governo tem d&eacute;ficits anuais cr&ocirc;nicos, se gastar mais, ou ele aumenta impostos, ou corta gastos administrativos e custeio dos servi&ccedil;os p&uacute;blicos, ou faz mais d&iacute;vidas. N&atilde;o existe outra op&ccedil;&atilde;o. Em tese, at&eacute; h&aacute;: o governo pode imprimir dinheiro para pagar os gastos. Mas a&iacute;, vem infla&ccedil;&atilde;o que, al&eacute;m de ser um imposto sem lei, destr&oacute;i o sistema de pre&ccedil;os e prejudica o crescimento econ&ocirc;mico. Fabricar dinheiro &eacute; imprimir papel pintado sem lastro na produ&ccedil;&atilde;o de bens e servi&ccedil;os. Se isso fizesse a riqueza de algu&eacute;m, n&atilde;o haveria pa&iacute;s pobre no mundo.<br /> <br /> A segunda li&ccedil;&atilde;o importante &eacute;: o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) &eacute; feito pelo setor privado, isto &eacute;, pelas pessoas e empresas. O governo contribui quando constr&oacute;i os bens de uso coletivo (caso das rodovias, ferrovias, pra&ccedil;as p&uacute;blicas, etc.) que s&atilde;o necess&aacute;rios, por&eacute;m insuficientes. Ademais, se o dinheiro que o governo usa para pagar suas obras &eacute; retirado da sociedade, diminui o dinheiro dispon&iacute;vel para consumo e investimento do setor privado.<br /> <br /> Terceira li&ccedil;&atilde;o valiosa: n&atilde;o h&aacute; sistema produtivo sem a fun&ccedil;&atilde;o empresarial, nem nos regimes comunistas mais radicais. A produ&ccedil;&atilde;o de bens e servi&ccedil;os exige a uni&atilde;o dos fatores de produ&ccedil;&atilde;o (recursos naturais, trabalho e capital), que n&atilde;o podem se juntar espontaneamente. Algu&eacute;m tem de reuni-los, decidir o que produzir, o quanto produzir, para quem produzir e coordenar o processo. Essa &eacute; a fun&ccedil;&atilde;o empresarial, que existe em qualquer sistema, mesmo onde &eacute; proibida a propriedade privada dos meios de produ&ccedil;&atilde;o.<br /> <br /> Um pa&iacute;s onde n&atilde;o existisse a figura do empres&aacute;rio privado, todas as empresas seriam estatais e a fun&ccedil;&atilde;o empresarial seria comandada por burocratas, que s&atilde;o capitalistas sem risco, em boa parte ineficientes, opressores e corruptos. No socialismo real, como ocorreu na Uni&atilde;o Sovi&eacute;tica, a economia estatizada funcionou mal, sobretudo porque sem mercado n&atilde;o h&aacute; pre&ccedil;o, sem pre&ccedil;o n&atilde;o h&aacute; c&aacute;lculo econ&ocirc;mico, e sem isso a economia n&atilde;o funciona. Ludwig von Mises produziu farto material provando isso j&aacute; nos 1920.<br /> <br /> A economia estatizada, sem mercado livre, falhou a ponto de Antonio Gramsci, te&oacute;rico do comunismo, ter dito &agrave;s esquerdas para abandonarem a ideia de acabar com a propriedade privada, e que a economia deve ser mantida nas m&atilde;os do setor privado, com o governo carregando as pessoas e as empresas com tributos para estatizar a sa&uacute;de, a educa&ccedil;&atilde;o e a cultura, controlar a imprensa, penetrar no meio universit&aacute;rio e cooptar os intelectuais. Para tanto, propunha Gramsci que o governo tomasse 40% ou 50% da renda nacional, e tudo ficaria &agrave; merc&ecirc; do comando do governo.<br /> <br /> Em uma sociedade liberal, o papel do governo &eacute; outro: &eacute; construir um ambiente institucional favor&aacute;vel &agrave; cria&ccedil;&atilde;o de empresas, colocar o indiv&iacute;duo acima do Estado e deixar o cidad&atilde;o livre para desenvolver seu projeto de felicidade pessoal, com a condi&ccedil;&atilde;o de que respeite a vida, a liberdade e a propriedade de seu semelhante. Nas sociedades civilizadas, o mais importante &eacute; saber o que o governo n&atilde;o deve ser e o que n&atilde;o deve fazer, ou seja, a arte de governo implica concentra&ccedil;&atilde;o de poderes, logo, &eacute; preciso limitar os poderes do governo.<br /> &nbsp;<br /> <b><i><img src="/uploads/image/artigos_jose-pio-martins_ economista-reitor-up_.jpg" width="60" hspace="3" height="80" align="left" alt="" /><br /> <br /> <br /> Jos&eacute; Pio Martins</i></b>, economista, &eacute; reitor da Universidade Positivo