Praxeologia, economia e o entendimento da ação humana

23 de novembro de 2018 às 16:50

José Pio Martins
&quot;O ser humano tem tr&ecirc;s necessidades b&aacute;sicas iniciais: alimento, abrigo e repouso. Se elas n&atilde;o forem atendidas, em poucos dias o homem morre. Nas comunidades primitivas, em que outras necessidades quase n&atilde;o existiam, os homens sa&iacute;am de manh&atilde; e voltavam com o produto de suas atividades de ca&ccedil;a, coleta e pesca, e ent&atilde;o se alimentavam das frutas coletadas, dos peixes pescados e dos animais abatidos. Por &oacute;bvio, nem todos os membros da comunidade participavam do trabalho, a exemplo das crian&ccedil;as.<br /> <br /> Para abrigar o corpo e se proteger das intemp&eacute;ries do clima, usavam couro de animais, folhagens e adentravam as cavernas, onde repousavam e dormiam. Assim vivam as comunidades primitivas, tamb&eacute;m dividiam as tarefas e repartiam o que produziam. Se algu&eacute;m quiser saber como nasceu a economia (sistema de produ&ccedil;&atilde;o, distribui&ccedil;&atilde;o, circula&ccedil;&atilde;o e consumo), basta remontar &agrave; hist&oacute;ria e ver que ela nasceu com a luta do animal homem para preservar sua vida.<br /> <br /> Nesse sentido, a economia &eacute; a ci&ecirc;ncia da a&ccedil;&atilde;o humana, definida como o emprego de meios para atingir fins. &Agrave; medida que a popula&ccedil;&atilde;o foi aumentando, instrumentos de produ&ccedil;&atilde;o foram inventados (os chamados &ldquo;bens de capital&rdquo;, como as ferramentas movidas pelos bra&ccedil;os humanos), o conhecimento sobre as leis da natureza foi se ampliando, a coexist&ecirc;ncia em grupos se expandiu, provocando o surgimento de outras necessidades, outras atividades e formas novas de produ&ccedil;&atilde;o, distribui&ccedil;&atilde;o e consumo.<br /> <br /> Com o passar do tempo, come&ccedil;aram a se misturar a&ccedil;&otilde;es humanas de natureza puramente econ&ocirc;mica com formas de organiza&ccedil;&atilde;o das comunidades (&eacute; o caso das cidades e, com elas, o alvorecer da pol&iacute;tica) e as intera&ccedil;&otilde;es e conflitos da vida coletiva (estudados pela sociologia), e a a&ccedil;&atilde;o humana passou a ser observada, estudada e explicada por leis e regras que poderiam ser englobadas em uma &uacute;nica ci&ecirc;ncia: a ci&ecirc;ncia da a&ccedil;&atilde;o humana, que existe com o nome de &ldquo;praxeologia&rdquo;, com sua teoria geral da a&ccedil;&atilde;o humana.<br /> <br /> O termo &ldquo;praxeologia&rdquo; foi empregado por Espinas, talvez pela primeira vez, em 1890, e vem do grego pr&aacute;xis (pr&aacute;tica, h&aacute;bito, a&ccedil;&atilde;o). A rigor, a praxeologia &eacute; uma ci&ecirc;ncia maior, que seria a soma da economia, sociologia, pol&iacute;tica e psicologia. Para as rela&ccedil;&otilde;es humanas em comunidade e para a a&ccedil;&atilde;o humana no &acirc;mbito da economia e das rela&ccedil;&otilde;es de mercado, foram escritas as leis jur&iacute;dicas a fim de regular e controlar a vida e os atos humanos em sociedade, um corpo de leis tendo por base uma filosofia do direito. Esse ordenamento regulat&oacute;rio passou a fazer parte do conjunto das ci&ecirc;ncias sociais que hoje regem o destino das na&ccedil;&otilde;es.<br /> <br /> A economia &eacute; uma das mais novas ci&ecirc;ncias e, &agrave; medida que o homem foi inventando m&aacute;quinas, processos e tecnologias &ndash; com a ajuda da f&iacute;sica, da qu&iacute;mica e de outras ci&ecirc;ncias da natureza &ndash;, as necessidades se multiplicaram. Com o aumento da complexidade da vida social, descobriu-se haver uma regularidade e interdepend&ecirc;ncia nos fen&ocirc;menos de mercado, cujo entendimento deixou a humanidade aturdida e confusa, e levou &agrave; forma&ccedil;&atilde;o de um novo corpo de teorias para explicar a a&ccedil;&atilde;o humana e suas consequ&ecirc;ncias na luta di&aacute;ria para atender as necessidades m&uacute;ltiplas com os recursos escassos da natureza, do capital e do trabalho.<br /> <br /> Durante s&eacute;culos, os fil&oacute;sofos e os estudiosos da a&ccedil;&atilde;o humana tentaram descobrir as leis (cient&iacute;ficas) que governam o destino e a evolu&ccedil;&atilde;o da hist&oacute;ria humana. A evolu&ccedil;&atilde;o da economia (a ci&ecirc;ncia, n&atilde;o o sistema) mostrou ao mundo que existe um outro aspecto, diferente do bem e do mal, do justo e do injusto, segundo o qual a a&ccedil;&atilde;o humana podia ser considerada. Quem melhor analisou a a&ccedil;&atilde;o humana sob as teorias da nova ci&ecirc;ncia foi o grande Ludwig von Mises (1881-1973), um desses g&ecirc;nios raros que habitaram o planeta.<br /> <br /> Mises dizia que toda a&ccedil;&atilde;o humana representa uma escolha e, ao escolher, o homem opta n&atilde;o apenas entre bens materiais e servi&ccedil;os, mas entre todos os valores humanos. Assim, os te&oacute;ricos come&ccedil;aram a entender a economia (agora, o sistema) como uma m&aacute;quina de produzir, distribuir e consumir a partir de uma &ldquo;ci&ecirc;ncia da escolha&rdquo;. Isto &eacute;, at&eacute; mesmo a escolha de seu trabalho e dos atos de compra e venda no mercado se conecta com as escolhas que o homem faz em rela&ccedil;&atilde;o aos valores que lhe s&atilde;o oferecidos para op&ccedil;&atilde;o.<br /> <br /> Quando a economia comportamental ganhou fama, muitos pensaram estar diante de uma novidade. Mas n&atilde;o. O comportamento do agente homem no mercado j&aacute; vinha sendo estudado desde ao menos 1850, provocando a uni&atilde;o entre os fen&ocirc;menos econ&ocirc;micos e as an&aacute;lises cient&iacute;ficas oferecidas pela psicologia. A partir do momento em que o Estado come&ccedil;ou a crescer e a se tornar uma f&aacute;brica de normas intervencionistas na vida do indiv&iacute;duo, sobretudo ap&oacute;s a Primeira Guerra Mundial, o entendimento da economia passou a exigir conhecimento das teorias econ&ocirc;micas e, tamb&eacute;m, da psicologia, da filosofia, do direito, da sociologia e da pol&iacute;tica. Como dizia Friedrich von Hayek, n&atilde;o &eacute; bom economista quem &eacute; apenas economista.<br /> &nbsp;<br /> <i><b><img src="/uploads/image/artigos_jose-pio-martins_ economista-reitor-up_.jpg" alt="" width="60" hspace="3" height="80" align="left" /><br /> <br /> <br /> Jos&eacute; Pio Martins</b></i>, economista, &eacute; reitor da Universidade Positivo.