A Previdência que sonhamos está aqui

25 de março de 2019 às 17:41

Antonio Neto
H&aacute; mais de duas d&eacute;cadas os sucessivos governos abordam a necessidade de reformar o sistema previdenci&aacute;rio brasileiro. Nesse tempo, desde Fernando Henrique, in&uacute;meras altera&ccedil;&otilde;es j&aacute; foram implementadas no regime geral, nas pens&otilde;es e na aposentadoria dos servidores p&uacute;blicos. Nenhuma delas foi para melhorar a remunera&ccedil;&atilde;o dos aposentados ou pensionistas. Pelo contr&aacute;rio, s&oacute; piorou.<br /> <br /> Mesmo assim, a Seguridade Social brasileira mant&eacute;m um sistema vigoroso de distribui&ccedil;&atilde;o de renda. S&atilde;o 30,2 milh&otilde;es de brasileiros que recebem da Previd&ecirc;ncia, sendo 61,29% do total o valor de at&eacute; um sal&aacute;rio m&iacute;nimo. Isso representa 40,36% do gasto total da Previd&ecirc;ncia; at&eacute; dois sal&aacute;rios, o montante de beneficiados chega a 80,85%. <br /> <br /> Chegamos a 2019, uma forte e corros&iacute;vel press&atilde;o se instalou novamente para reformar a Previd&ecirc;ncia, caso contr&aacute;rio o Brasil quebraria. Para tanto, a m&aacute;quina de propaganda do governo, formado majoritariamente por militares e atores do mercado financeiro, diz que ir&aacute; combater privil&eacute;gios e democratizar o sistema.<br /> <br /> A proposta enviada pelo presidente Bolsonaro ao Congresso causa arrepios em todo os brasileiros, sobretudo nos trabalhadores mais sofridos e mais pobres, como agricultores, oper&aacute;rios do ch&atilde;o de f&aacute;brica e trabalhadoras dom&eacute;sticas.<br /> <br /> Diante da aterrorizante proposta, todos nos perguntamos: ser&aacute; que n&atilde;o existe algum sistema de aposentadoria que seja mais justo? Ser&aacute; que nenhum pa&iacute;s conseguiu ofertar tranquilidade e bem-estar para um aposentado e sua fam&iacute;lia? Sim, esse sistema existe.<br /> <br /> Numa determinada na&ccedil;&atilde;o, cujo nome revelaremos mais adiante, os trabalhadores se aposentam, em m&eacute;dia, entre 45 e 50 anos de idade, mulheres e homens, e n&atilde;o aos 62 e 65 anos, respectivamente, como quer Bolsonaro. H&aacute; casos registrados de aposentadorias com 33 anos de idade, o que n&atilde;o corresponde nada &agrave; situa&ccedil;&atilde;o brasileira, na qual em algumas regi&otilde;es do Pa&iacute;s, incluindo a periferia de capitais, a expectativa de vida n&atilde;o atinge a idade proposta na reforma.<br /> <br /> Nesse pa&iacute;s, o valor m&eacute;dio das aposentadorias equivale a 13,7 sal&aacute;rios m&iacute;nimos e suas pens&otilde;es, em caso de falecimento do titular, s&atilde;o estendidas integralmente a seus filhos at&eacute; completarem 24 anos (se estudantes) e vitaliciamente a suas filhas, caso solteiras. Bem diferente da proposta apresentada pelo governo de aumentar a idade de 65 para 70 anos para ter acesso a um sal&aacute;rio m&iacute;nimo aos mais miser&aacute;veis e de cortar para 50% a pens&atilde;o do c&ocirc;njuge em caso de morte, mais 10% por filho at&eacute; atingir a maioridade.<br /> <br /> Al&eacute;m de possu&iacute;rem estabilidade em seus empregos, como rege a Conven&ccedil;&atilde;o 158 da Organiza&ccedil;&atilde;o Internacional do Trabalho, ao se aposentarem esses trabalhadores ganham uma promo&ccedil;&atilde;o salarial, recebendo n&atilde;o s&oacute; o sal&aacute;rio imediatamente acima do seu cargo, mas integral. Devido &agrave; idade baixa, muitos se dedicam a palestras e consultorias, aumentando suas rendas. <br /> <br /> Nada parecido com a situa&ccedil;&atilde;o do trabalhador brasileiro; cerca de 50 milh&otilde;es est&atilde;o na informalidade e 13 milh&otilde;es, desempregados. Como o tempo de contribui&ccedil;&atilde;o exigido pela reforma &eacute; de 40 anos para ter 100% de aposentadoria, um pobre que come&ccedil;a a trabalhar aos 14 anos como jovem aprendiz ter&aacute; de contribuir 48 anos (mulher) ou 51 anos (homem) para atingir a idade m&iacute;nima de aposentadoria (62/65 anos). Isso se ele for o maior sortudo do planeta e nunca for demitido.<br /> <br /> Pois bem, meus caros. O modelo de aposentadoria citada acima &eacute; dos militares brasileiros, os pr&oacute;ceres proponentes da reforma que ir&aacute; impedir milh&otilde;es de brasileiros de obterem a aposentadoria. E o soldado que se aposentou aos 33 anos, ali&aacute;s, capit&atilde;o, &eacute; Jair Bolsonaro, o presidente que est&aacute; propondo esse sacrif&iacute;cio para todo o povo, afirmando que ir&aacute; acabar com regalias, uma grande mentira, pois j&aacute; &eacute; not&oacute;rio que a reforma proposta aos militares ir&aacute; aumentar ainda mais seus soldos.<br /> <br /> Muito contradit&oacute;rio, uma vez que o rombo nas aposentadorias dos militares &eacute; de R$ 40,5 bilh&otilde;es. Em 2018, as receitas somaram R$ 2,1 bilh&otilde;es, enquanto as despesas, R$ 42,614 bilh&otilde;es.<br /> <br /> Certamente o povo brasileiro tem alta estima pelas For&ccedil;as Armadas e devemos fortalecer cada vez mais esta institui&ccedil;&atilde;o. Mas nos parece um tanto injusto, para n&atilde;o dizer hip&oacute;crita, que um governo formado por militares tente nos for&ccedil;ar a acatar uma reforma que praticamente acaba com a Previd&ecirc;ncia P&uacute;blica Brasileira, jogando milh&otilde;es de pessoas na mis&eacute;ria, mantendo e ampliando seus benef&iacute;cios de aposentadoria.<br /> <br /> Dizem que os militares possuem particularidades e podem at&eacute; arriscar suas vidas em caso de guerra. Creio que os militares brasileiros n&atilde;o est&atilde;o correndo mais risco de vida do que os trabalhadores em geral. Todos os dias, a cada 3 horas, 38 minutos e 43 segundos, um trabalhador ou uma trabalhadora morre v&iacute;tima de acidente de trabalho. O que dizer para uma vi&uacute;va de um policial civil, federal ou militar assassinado no cumprimento do dever? Diferente do militar que pode passar a pens&atilde;o integral para sua filha, e at&eacute; para a neta, se o policial vier a morrer, sua esposa receber&aacute;, dependendo da idade, apenas 50% da pens&atilde;o. Injusto, n&atilde;o acham?<br /> <br /> Por essas e outras, &eacute; poss&iacute;vel afirmar com toda certeza: essa reforma &eacute; injusta, hip&oacute;crita e danosa para o trabalhador e trabalhadora, e por isso devemos refut&aacute;-la.<br /> <br /> <b><i>Antonio Neto</i></b>. Presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros