Ajuste no lugar errado

16 de setembro de 2019 às 09:08

Coriolano Xavier
Seja por aperto nas contas p&uacute;blicas, ou por doutrina econ&ocirc;mica, chegou ao mercado not&iacute;cias de estudos no Minist&eacute;rio da Economia para tributar investimentos feitos em t&iacute;tulo que financia o agroneg&oacute;cio. A ideia seria o fim da isen&ccedil;&atilde;o de imposto de renda (IR) para aplica&ccedil;&otilde;es em Letra de Cr&eacute;dito do Agroneg&oacute;cio (LCA), o que tornaria mais dif&iacute;cil atrair investidores para esse papel.<br /> &nbsp;<br /> A LCA foi criada em 2004 (Lei 11.076) e, na &uacute;ltima safra, levou ao campo R$ 30 bilh&otilde;es em financiamento para os benefici&aacute;rios do cr&eacute;dito rural. No entanto, esta n&atilde;o &eacute; a primeira vez em que se pensa no fim de sua isen&ccedil;&atilde;o tribut&aacute;ria: j&aacute; em 2015, no per&iacute;odo Dilma Roussef, se tentou tributar este t&iacute;tulo. Agora, com a crise fiscal tirando o sono do Governo e a Proposta de Lei Or&ccedil;ament&aacute;ria 2020 em discuss&atilde;o no Congresso, &eacute; bom o agro estar atento a potenciais amea&ccedil;as pelo fim da isen&ccedil;&atilde;o de IR para a LCA, pois ela &eacute; estrat&eacute;gica para financiar o setor.<br /> &nbsp;<br /> O engenheiro agr&ocirc;nomo Ivan Wedekin, coordenador dos trabalhos que resultaram na lei dos t&iacute;tulos do agro, &agrave; &eacute;poca em que foi Secret&aacute;rio de Pol&iacute;tica Agr&iacute;cola, na gest&atilde;o do Ministro Roberto Rodrigues, recorda a estrat&eacute;gia embutida na implanta&ccedil;&atilde;o do t&iacute;tulo. Com a falta de recursos de cr&eacute;dito para viabilizar o crescimento da agricultura, o Governo ent&atilde;o instituiu a LCA e outros dois t&iacute;tulos (CRA e CDCA)* para financiar a comercializa&ccedil;&atilde;o. Em 2015, o Governo estabeleceu uma exigibilidade aos bancos: para emitir a LCA, teriam que emprestar parte do montante captado aos benefici&aacute;rios do cr&eacute;dito rural. <br /> &nbsp;<br /> Na safra 2018-2019, por exemplo, a LCA ofertou R$ 29,6 bilh&otilde;es, ou 16,9% de todo o cr&eacute;dito rural (R$ 174 bilh&otilde;es). No custeio deixou R$ 15,9 bilh&otilde;es (16%), no investimento R$ 1,7 bilh&atilde;o e no cr&eacute;dito para comercializa&ccedil;&atilde;o e industrializa&ccedil;&atilde;o proporcionou R$ 11,9 bilh&otilde;es (36% do total). &ldquo;Uma integra&ccedil;&atilde;o excelente entre fontes de financiamento&rdquo;, explica Ivan Wedekin. &ldquo;<b><i>As fontes tradicionais, como dep&oacute;sitos &agrave; vista e poupan&ccedil;a rural, financiaram o custeio da produ&ccedil;&atilde;o, em especial pequenos e m&eacute;dios produtores; e a LCA viabilizou o cr&eacute;dito para comercializa&ccedil;&atilde;o</i></b>&rdquo;. <br /> &nbsp;<br /> Com um hipot&eacute;tico fim da isen&ccedil;&atilde;o de IR para a LCA e perda relativa de sua atratividade, de onde vir&atilde;o recursos como os R$ 30 bilh&otilde;es que ela gerou na &uacute;ltima safra? Isso &eacute; dinheiro captado no mercado financeiro urbano que vai parar na ro&ccedil;a, custeando a produ&ccedil;&atilde;o. &ldquo;<i><b>N&atilde;o h&aacute; justificativa para desmontar esse mercado de t&iacute;tulos agro e fazer ajuste fiscal em cima de uma agricultura j&aacute; ajustada, uma das menos subsidiadas do mundo</b></i>&rdquo; &ndash; alerta Wedekin. <br /> &nbsp;<br /> De fato, o Brasil compete com fortes subs&iacute;dios praticados em pa&iacute;ses que s&atilde;o importantes concorrentes nossos, no mercado agropecu&aacute;rio internacional. De acordo com a Organiza&ccedil;&atilde;o para Coopera&ccedil;&atilde;o e Desenvolvimento Econ&ocirc;mico (OCDE), na m&eacute;dia do per&iacute;odo 2015-2017, o subs&iacute;dio dado aos produtores (propor&ccedil;&atilde;o da receita bruta total que decorre da pol&iacute;tica agr&iacute;cola) est&aacute; em 46,0% no Jap&atilde;o, 19,6% na Uni&atilde;o Europeia, 15,5% na China e 9,6% nos EUA, frente a m&iacute;nimos 2,7% no Brasil. O agricultor brasileiro produz muito e recebe pouco do governo federal. <br /> &nbsp;<br /> Segundo Ivan Wedekin, a pol&iacute;tica agr&iacute;cola custou ao governo federal R$ 8,7 bilh&otilde;es em 2018, para gerar o maior saldo da balan&ccedil;a agr&iacute;cola do mundo. Em contrapartida, foram gastos R$ 340 bilh&otilde;es com o pagamento de juros da d&iacute;vida do Governo. &ldquo;<i><b>A Agricultura n&atilde;o &eacute; problema, mas sim a solu&ccedil;&atilde;o, e o seu crescimento depende do financiamento pelos t&iacute;tulos do agroneg&oacute;cio</b></i>&rdquo;.<br /> <br /> <img src="/uploads/image/artigos_coriolano-xavier_vice-presidente-de-comunicacao-ccas.jpg" width="60" hspace="3" height="80" align="left" alt="" /><br /> <br /> <br /> Por <i><b>Coriolano Xavier</b></i>, membro do Conselho Cient&iacute;fico Agro Sustent&aacute;vel (CCAS) e Professor da ESPM.