Pensão paga a filhas solteiras de ex-parlamentares e ex-servidores é absurda?
29 de janeiro de 2020 às 11:06
Fabiana Cagnoto
No último dia 19 de janeiro, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, afirmou ser “absurdo” o pagamento de pensões a filhas solteiras de ex-parlamentares e ex-servidores. Entre os casos que surpreendeu Maia está o da pesquisadora Helena Hirata, que mora há 49 anos em Paris e recebe uma pensão mensal de R$ 16.881,50 apenas por ser solteira e filha de ex-deputado. O deputado afirmou que vai trabalhar para que o Supremo Tribunal Federal (STF) mude a interpretação da lei que garante o benefício. Entretanto, é preciso ter cautela ao analisar a situação. <br />
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Isso porque, é pacífico o entendimento de que o benefício de pensão por morte é regido pela legislação vigente na data do óbito do instituidor da pensão, entendimento, inclusive, sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). <br />
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Nesse contexto, as pensões pagas as filhas solteiras de ex-parlamentares e ex-servidores são garantidas pela Lei n.º 3.373/58, que dispõe: “a filha solteira, maior de 21 anos só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente.” <br />
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Desta feita, bem observou o STF, que as pensões concedidas às filhas dos ex-servidores sob a égide da Lei n.º 3.373/58 encontram-se consolidadas e somente podem ser cessadas se um dos dois requisitos previstos na lei for superado, ou seja, se deixarem de ser solteiras ou se passarem a ocupar cargo público permanente. <br />
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Assim, algumas situações não estão a mercê de interpretação, existem princípios que norteiam o direito e cabe ao Supremo Tribunal Federal garantir que sejam aplicados. <br />
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Um exemplo desta situação na prática foi um caso recente, no qual conseguimos o restabelecimento da pensão à beneficiária M.C.A.B, filha solteira, que amparada desde o ano de 1987, teve o seu benefício cessado no ano de 2017 em razão de ter possuído inscrição como microempreendedora individual nos anos de 1997 e 2000. Na ocasião, comprovou-se que a beneficiária não incorreu em nenhuma das hipóteses previstas há época como causas extintivas da pensão, merecendo destaque a decisão proferida pela Turma Recursal do Juizado Especial Federal de São Paulo: <br />
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“Dessa forma, da análise dos documentos acostados aos autos, constata-se que a Requerente cumpre os requisitos exigidos em lei para a concessão do benefício, considerando que é maior de 21 anos (atualmente possui 59 anos) bem como é solteira, pois não há elementos nos autos a apontar para ocorrência de formalização de casamento ou união estável, e não ocupa cargo público permanente. Forçoso reconhecer, assim, que a Autora possui direito adquirido, com fulcro na lei vigente ao tempo do óbito do segurado, à percepção da pensão temporária, enquanto mantiver preenchidos os requisitos previstos naquela norma.” <br />
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Portanto, há que se deixar de lado posicionamentos políticos, julgamentos pessoais acerca do justo e do injusto, bem como a interpretação evolutiva, que não podem ter o condão de modificar os atos perfeitamente constituídos sob a égide da legislação protetiva. O direito adquirido é respaldado pelo artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal e precisa ser respeitado. <br />
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Por <b><i>Fabiana Cagnoto</i></b> é advogada do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados