Decisão do STF de não incidência do Funrural na exportação indireta beneficia agricultores

12 de maio de 2020 às 16:12

Rony Mendes Santos
O Funrural &ndash; Fundo de Assist&ecirc;ncia ao Trabalhador Rural - &eacute; um recolhimento obrigat&oacute;rio sobre as receitas das atividades agr&iacute;colas e essencial para financiar a previd&ecirc;ncia do trabalhador rural. Ele incide sobre a receita bruta da comercializa&ccedil;&atilde;o da produ&ccedil;&atilde;o, sendo distribu&iacute;do entre INSS, RAT e SENAR. <br /> <br /> Tem sido cada vez mais recorrente o questionamento sobre a legalidade da cobran&ccedil;a do Funrural no Judici&aacute;rio. No total s&atilde;o quatro os recursos extraordin&aacute;rios com repercuss&atilde;o geral reconhecida sobre o assunto (RE 363.852, 596.177, 718.874 e 761.263), dois dos quais cabe destaque o Recurso Extraordin&aacute;rio 718.874/RS-RG, que declarou a constitucionalidade do fundo rural. Desde ent&atilde;o &eacute; cobrado do produtor rural um percentual (al&iacute;quota) de at&eacute; 2,5% sobre a receita bruta proveniente da comercializa&ccedil;&atilde;o da produ&ccedil;&atilde;o rural e agroindustrial.<br /> <br /> Nesta hip&oacute;tese, estavam desobrigados do pagamento apenas aqueles produtores rurais cuja opera&ccedil;&atilde;o era protegida pela imunidade tribut&aacute;ria. Esta imunidade est&aacute; prevista no artigo 149, par&aacute;grafo 2&ordm;, da Constitui&ccedil;&atilde;o Federal, que garante que os recursos financeiros obtidos em decorr&ecirc;ncia de exporta&ccedil;&atilde;o s&atilde;o imunes &agrave; tributa&ccedil;&atilde;o. Entretanto, a Receita Federal do Brasil (RFB) exigia o pagamento do Funrural sobre as receitas advindas de exporta&ccedil;&otilde;es indiretas, ou seja, aquelas exporta&ccedil;&otilde;es que n&atilde;o eram realizadas diretamente pelo produtor, mas por interm&eacute;dio de cooperativas, trading company ou Empresas Comerciais Exportadoras (ECE). <br /> <br /> Em brev&iacute;ssimo resumo, a Receita determinava a cobran&ccedil;a do Funrural em todas as exporta&ccedil;&otilde;es indiretas sob o fundamento destas normativas. Tais exporta&ccedil;&otilde;es n&atilde;o estariam sujeitas &agrave; imunidade tribut&aacute;ria, prevista no artigo 149, par&aacute;grafo 2&ordm;, da Constitui&ccedil;&atilde;o Federal. <br /> <br /> Ocorre que em fevereiro de 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou o entendimento de que a receita decorrente de opera&ccedil;&atilde;o de exporta&ccedil;&atilde;o indireta &eacute; imune de tributa&ccedil;&atilde;o, igualmente aos casos de exporta&ccedil;&atilde;o direta.&nbsp; &nbsp;<br /> <br /> Nesse sentido, &eacute; importante lembrar que a imunidade tribut&aacute;ria &eacute; norma constitucional que estabelece expressamente a incompet&ecirc;ncia das pessoas pol&iacute;ticas quanto &agrave; cobran&ccedil;a de tributos sobre determinadas e espec&iacute;ficas situa&ccedil;&otilde;es. Em s&iacute;ntese, essa imunidade &eacute; uma prote&ccedil;&atilde;o que a Constitui&ccedil;&atilde;o Federal confere aos contribuintes, considerada uma n&atilde;o incid&ecirc;ncia tribut&aacute;ria constitucionalmente qualificada por alguma conjuntura s&oacute;cio/econ&ocirc;mica ou pol&iacute;tica. Significa dizer que a imunidade tribut&aacute;ria torna ausente a pr&oacute;pria compet&ecirc;ncia tribut&aacute;ria relativamente &agrave; situa&ccedil;&atilde;o imunizada, n&atilde;o podendo sequer o legislador determinar a incid&ecirc;ncia tribut&aacute;ria sobre tal caso.<br /> <br /> Assim, a partir da previs&atilde;o constitucional de imunidade &agrave;s receitas advindas de exporta&ccedil;&otilde;es, que n&atilde;o diferencia como a exporta&ccedil;&atilde;o ser&aacute; feita, n&atilde;o pode o legislador (e tampouco a Administra&ccedil;&atilde;o P&uacute;blica, por meio de Instru&ccedil;&otilde;es Normativas) pretender criar uma diferencia&ccedil;&atilde;o entre receitas advindas de exporta&ccedil;&otilde;es diretas e indiretas, sob pena de n&iacute;tida e ineg&aacute;vel inconstitucionalidade.<br /> <br /> Al&eacute;m de extremamente importante e favor&aacute;vel aos contribuintes e produtores rurais, a decis&atilde;o do STF &eacute; juridicamente perfeita. A quest&atilde;o que se coloca como enfoque principal neste artigo &eacute; a quem esta decis&atilde;o ser&aacute; aplicada. Ao contr&aacute;rio do que uma primeira an&aacute;lise possa indicar, por se tratar de decis&atilde;o que firmou tese em Repercuss&atilde;o Geral, esta decis&atilde;o n&atilde;o se aplica indistintamente a todo e qualquer produtor que tenha realizado exporta&ccedil;&otilde;es indiretas.<br /> <br /> Vale lembrar que os votos desta recente decis&atilde;o do STF ainda n&atilde;o foram publicados. Quando isso acontecer, a Fazenda Nacional abre o prazo para interposi&ccedil;&atilde;o de Embargos de Declara&ccedil;&atilde;o, atrav&eacute;s dos quais poder&aacute; pleitear, entre outros pontos, a modula&ccedil;&atilde;o dos efeitos. Ou seja, poder&aacute; o STF ainda restringir os efeitos da decis&atilde;o, limitando sua retroatividade, a fim de que ela n&atilde;o atinja opera&ccedil;&otilde;es ocorridas antes da data do julgamento. <br /> <br /> A decis&atilde;o abre um importante precedente, j&aacute; que o Funrural pode ser extinto de todas a exporta&ccedil;&otilde;es agr&iacute;colas diretas ou indiretas, mesmo que o produtor j&aacute; tenha feito o pagamento do tributo (situa&ccedil;&atilde;o na qual ter&atilde;o direito &agrave; repeti&ccedil;&atilde;o dos valores pagos dos &uacute;ltimos 5 anos). <br /> <br /> Al&eacute;m disso, os produtores podem impugnar dos d&eacute;bitos, parcelados ou n&atilde;o, em Programa de Regulariza&ccedil;&atilde;o Tribut&aacute;ria Rural (PRR), para isso precisam buscar junto aos compradores os Memorandos de Exporta&ccedil;&otilde;es dos &uacute;ltimos 5 anos. <br /> <br /> O impacto da decis&atilde;o para os produtores rurais pode variar dependendo do tipo de produ&ccedil;&atilde;o. A Aprosoja-MT, por exemplo, estima que mais da metade do passivo aos produtores de soja fica extinto. No caso do milho, o mesmo por acontecer com 25% da d&iacute;vida. Em n&uacute;meros, isso representaria cerca de R$ 11 bilh&otilde;es.<br /> <br /> Por <i><b>Rony Mendes Santos</b></i>, s&oacute;cio da Mendes Santos Advogados. Especialista em Direito Tribut&aacute;rio pela PUC/MG e em Direito Processual Civil pela EPD/SP.