O Bajulador e a Política

20 de maio de 2020 às 20:13

Gerson Leite de Moraes
Nero Cl&aacute;udio C&eacute;sar, imperador romano, foi um cr&aacute;pula. Ele nasceu de uma fam&iacute;lia complicada, assim que veio ao mundo, seu pai biol&oacute;gico sentenciou aos amigos que lhe felicitavam, dizendo, que &quot;dele e sua esposa Agripina, n&atilde;o poderia nascer nada que n&atilde;o fosse detest&aacute;vel e funesto ao bem p&uacute;blico&quot;. De fato, assim a vida de Nero se desenvolveu. Ap&oacute;s a morte de seu pai chamado Dom&iacute;cio, foi adotado pelo imperador Cl&aacute;udio, quando tinha doze anos. Aos dezessete, participou do envenenamento daquele que o acolheu e tomou-lhe o trono, tornando-se o novo imperador. Casou-se tr&ecirc;s vezes, matou as tr&ecirc;s esposas, bem como matou seu meio-irm&atilde;o e sua m&atilde;e. <br /> <br /> Megaloman&iacute;aco, chamou ao m&ecirc;s de abril, &quot;o m&ecirc;s de Nero&quot; e projetou tamb&eacute;m substituir &quot;Roma&quot; por &quot;Ner&oacute;polis&quot;. Inicialmente adotou uma pol&iacute;tica populista, incentivava jogos, distribu&iacute;a presentes e vales para aquisi&ccedil;&atilde;o de trigo, roupas, ouro, prata, p&eacute;rolas e escravos, mas depois de quatorze anos de governo tudo come&ccedil;ou a mudar. <br /> <br /> Demonstrando descontentamento com a feiura dos antigos edif&iacute;cios, com a estreiteza e tortuosidade das ruas, mandou incendiar Roma, que ardeu por seis dias e noites seguidos. Tamb&eacute;m teve de enfrentar uma peste que, num &uacute;nico outono, matou mais de trinta mil romanos, com tudo isso, sua popularidade se esvaiu. Ap&oacute;s uma revolta no ex&eacute;rcito, ficou isolado, teve que fugir, mas antes procurou seus &quot;amigos bajuladores&quot;, mas ningu&eacute;m o atendeu. Ele, ent&atilde;o, desejou a morte, e como seus inimigos ainda estivessem longe, lamentou dizendo que naquele momento n&atilde;o tinha &quot;nem amigo e nem inimigo&quot; para auxili&aacute;-lo em seu projeto de p&ocirc;r cabo &agrave; vida. Veio a falecer pouco tempo depois, com trinta e dois anos, e o povo de Roma, ostentando o gosto da liberdade, corria de um lado para o outro da cidade, festejando a morte do lun&aacute;tico tirano. <br /> <br /> O fim de Nero &eacute; exemplar e lapidar, pois as trajet&oacute;rias dos tiranos parecem seguir sempre um roteiro muito semelhante, inicialmente amados e, no final de seus governos, odiados. <br /> <br /> Al&eacute;m do desequil&iacute;brio mental, t&iacute;pico dos ditadores populistas, outra coisa chama a aten&ccedil;&atilde;o e parece ser comum entre eles, a saber, o fato de que amam se cercarem de bajuladores. Eles t&ecirc;m um prazer enorme em serem incensados &agrave; categoria de estrategistas pol&iacute;ticos, de l&iacute;deres essenciais e brilhantes que precisam lutar em nome da p&aacute;tria e do bem comum, contra os inimigos reais ou imagin&aacute;rios. N&atilde;o h&aacute; advers&aacute;rios pol&iacute;ticos ou ideol&oacute;gicos, mas sim, inimigos que precisam ser eliminados a qualquer custo. A claque de bajuladores infla seus egos, alimenta seus sonhos mais macabros e os estimula a serem cada vez mais descolados da realidade. Eles vivem numa bolha, num mundo paralelo, onde todos, l&iacute;der e liderados, alimentados pela cultura da lisonja e do peleguismo, s&atilde;o programados para dizer &quot;sim&quot; a todas as sandices do l&iacute;der da caterva. <br /> <br /> Plutarco diz que &quot;a varejeira agarra-se &agrave;s orelhas dos touros, e o carrapato &agrave;s dos cachorros. Assim, o bajulador, ao deleitar com elogios as orelhas daqueles que amam a gl&oacute;ria, fica-lhes de tal maneira ligado, que eles n&atilde;o podem mais separar-se&quot;. Os tiranos e os maus pol&iacute;ticos, que s&atilde;o projetos de ditadores, no fundo, s&atilde;o seres fracos moralmente, por isso, precisam tanto da presen&ccedil;a dos bajuladores. Apesar de fracos, s&atilde;o perpetradores do mal e &eacute; por isso que em qualquer regime que se preze, e que se qualifique como democr&aacute;tico, &eacute; fundamental o sistema de freios e contrapesos, que tem por finalidade corrigir os impulsos devassos dos tiranos e da s&uacute;cia de bajuladores que o cerca. &Eacute; fato que o poder embriaga, mas causa danos maiores ao sujeito de personalidade fraca, por isso, caro leitor, todo aquele que almeja entrar na pol&iacute;tica precisa seguir o conselho do velho Plutarco, j&aacute; citado anteriormente. Ele diz: &quot;&Eacute; preciso arrancar do cora&ccedil;&atilde;o o amor-pr&oacute;prio e a boa opini&atilde;o sobre n&oacute;s pr&oacute;prios, pois estes s&atilde;o os nossos primeiros aduladores que, abrindo a porta aos bajuladores estranhos, tornam-nos presas f&aacute;ceis de seduzir. Se observarmos nossas palavras e nossos afetos, estaremos protegidos das armadilhas dos bajuladores&quot;. <br /> <br /> Caro leitor, quando voc&ecirc; for avaliar um pol&iacute;tico, analise tamb&eacute;m quem o cerca, se forem bajuladores tenazes, evite o pol&iacute;tico em quest&atilde;o e seu bando, pois eles far&atilde;o muito mal &agrave; na&ccedil;&atilde;o. <br /> <br /> <i><b>Gerson Leite de Moraes</b></i> &eacute; doutor em Filosofia e professor do curso de Teologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie.