RACISMO É OBSCENIDADE

06 de junho de 2020 às 11:49

José de Paiva Netto
A luta contra a discrimina&ccedil;&atilde;o racial sempre foi um ponto marcante em nossa palavra, durante as transmiss&otilde;es legion&aacute;rias da Boa Vontade. Isso suscitou uma s&eacute;rie de entrevistas por mim concedidas &agrave; imprensa, a exemplo da realizada pelo meu saudoso amigo Paulo Rappoccio Parisi (1921-2016), em 10 de outubro de 1981. Naquela ocasi&atilde;o, ele me arguiu:<br /> <br /> - O senhor julga que o racismo j&aacute; foi vencido em nossas fronteiras?<br /> <br /> Ao que respondi: Absolutamente, n&atilde;o. O racismo continua feroz no Brasil, embora se apresente de modo enrustido por aqui, se comparado ao regime de segrega&ccedil;&atilde;o na &Aacute;frica do Sul (est&aacute;vamos em 1981). Apesar da imensa luta dos abolicionistas, a escravid&atilde;o, sob diversos aspectos, n&atilde;o cessou. (...)<br /> <br /> Racismo &eacute; obscenidade (assim como preconceitos sociais, de g&ecirc;nero, religiosos, cient&iacute;ficos ou de qualquer outra esp&eacute;cie). Vai solapando n&atilde;o somente os esfor&ccedil;os dos negros, mas dos brancos pobres, dos &iacute;ndios, dos imigrantes... Trata-se, tamb&eacute;m, de uma discrimina&ccedil;&atilde;o social. A aus&ecirc;ncia do esp&iacute;rito solid&aacute;rio est&aacute; minando a humanidade. &Eacute; for&ccedil;oso erradicar, de vez, o racismo, pois, em seu bojo, surgem os mais tenebrosos tipos de persegui&ccedil;&atilde;o, que v&ecirc;m dificultando o estabelecimento da Paz no planeta. Todos juntos, sem des&acirc;nimo, temos de mudar esse vergonhoso quadro. Somos contra o racismo, porque lutamos, sobretudo, pela dignidade do ser humano.<br /> &nbsp;<br /> <b>Sa&iacute;da ideal para o Brasil</b><br /> &nbsp;<br /> Em O Capital de Deus, um de meus pr&oacute;ximos lan&ccedil;amentos, no cap&iacute;tulo &quot;Na&ccedil;&otilde;es anglo-sax&ocirc;nicas e miscigena&ccedil;&atilde;o&quot;, relembro que, ao ser entrevistado pelo radialista Paulo Vieira, no programa &quot;Jesiliel e os seus sucessos&quot;, na R&aacute;dio Est&eacute;reo Sul, de Volta Redonda/RJ, em 5 de abril de 1991, expressei ponto de vista que defendo desde a minha adolesc&ecirc;ncia:<br /> <br /> Uma sa&iacute;da para o Brasil come&ccedil;a pela necessidade de confiar nele pr&oacute;prio. O dia em que deixarmos de nos restringir ao simples status de copiadores e pararmos com essa conversa de que nosso pa&iacute;s &eacute; assim por ser resultado de uma miscigena&ccedil;&atilde;o de negros, europeus e &iacute;ndios, nos levantaremos do &quot;ber&ccedil;o espl&ecirc;ndido&quot; e n&atilde;o haver&aacute; ningu&eacute;m que nos possa esmorecer o &acirc;nimo.<br /> &nbsp;<br /> <b>Brilhante mesti&ccedil;agem</b><br /> &nbsp;<br /> Dizem por a&iacute;:<br /> <br /> - As na&ccedil;&otilde;es anglo-sax&ocirc;nicas, as germ&acirc;nicas, as n&atilde;o sei o que s&atilde;o formid&aacute;veis! Vejam como s&atilde;o hoje as que outrora colonizaram.<br /> <br /> Mas acontece que, na &eacute;poca de Roma, os anglo-sax&otilde;es eram considerados inferiores, os germ&acirc;nicos tamb&eacute;m. A G&aacute;lia, hoje Fran&ccedil;a, era um atraso. E, no entanto, aqueles povos cresceram. Tiveram tempo para isso (e souberam aproveit&aacute;-lo bem). &Eacute; preciso derrubar esse absurdo, que at&eacute; parece uma orquestra&ccedil;&atilde;o, que n&atilde;o se sabe de onde vem; ou se sabe?!... A todo momento voc&ecirc; encontra um distra&iacute;do proferindo essa enormidade, fomentando a derrota brasileira:<br /> <br /> - Olha, n&atilde;o tem jeito! Somos uma condenada etnia miscigenada de brancos, &iacute;ndios e negros.<br /> <br /> N&atilde;o acredito nisso e protesto contra essa burla suicida. Aqueles que achavam que nas regi&otilde;es subequatoriais n&atilde;o poderia surgir uma civiliza&ccedil;&atilde;o respeit&aacute;vel tamb&eacute;m est&atilde;o errados, porque nossa p&aacute;tria, apesar de todos os seus problemas, avan&ccedil;a (ainda que muitas vezes n&atilde;o pare&ccedil;a), contrariando essa ideia.<br /> <br /> Fato que se comprova no resultado de estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econ&ocirc;mica Aplicada (Ipea), que aponta o fen&ocirc;meno de &quot;escurecimento da popula&ccedil;&atilde;o brasileira&quot;. Em reportagem publicada pela Ag&ecirc;ncia Brasil, em 20 de novembro de 2008, Dia da Consci&ecirc;ncia Negra, encontramos:<br /> <br /> - a pesquisa indica que mudan&ccedil;as na maneira de pensar das pessoas e n&atilde;o elementos de cunho demogr&aacute;fico s&atilde;o respons&aacute;veis pela quase totalidade da mudan&ccedil;a. (...) De acordo com a publica&ccedil;&atilde;o &quot;Desigualdades Raciais, Racismo e Pol&iacute;ticas P&uacute;blicas 120 anos ap&oacute;s a Aboli&ccedil;&atilde;o&quot;, at&eacute; o in&iacute;cio dos anos 1990, a popula&ccedil;&atilde;o negra vinha aumentando de modo &quot;relativamente lento e vegetativo&quot;, por meio de uma taxa de fecundidade um pouco mais alta para pretos e pardos al&eacute;m do fato de que descendentes de casais de negros e brancos terem maior probabilidade de ter filhos pardos. J&aacute; em algum momento entre 1996 e 2001 come&ccedil;a um processo de mudan&ccedil;a na maneira como os brasileiros se veem. Durante o per&iacute;odo, segundo o Ipea, as pessoas passam a ter menos vergonha de se identificar como negras e deixam de se &quot;branquear&quot; para se legitimar socialmente.<br /> <br /> Em entrevista ao programa Conex&atilde;o Jesus - O Ecumenismo Divino, da Super Rede Boa Vontade de Comunica&ccedil;&atilde;o (r&aacute;dio, TV e internet), a profa. dra. Marina de Mello e Souza, livre-docente em Hist&oacute;ria da &Aacute;frica e ilustre professora do Departamento de Hist&oacute;ria da Universidade de S&atilde;o Paulo (USP), apresentou interessante an&aacute;lise, ap&oacute;s explanar sobre a hist&oacute;ria desse bel&iacute;ssimo continente, t&atilde;o importante ao equil&iacute;brio mundial:<br /> <br /> - Meu s&aacute;bio pai, j&aacute; falecido, dizia: &quot;No Brasil, existe branco brasileiro e preto brasileiro&quot;. Ou seja, aqui a gente n&atilde;o tem nem um branco e nem um preto, porque se voc&ecirc; colocar um preto brasileiro do lado de um preto africano, voc&ecirc; vai ver o quanto de miscigena&ccedil;&atilde;o tem ali. Ent&atilde;o, um branco brasileiro, ao conhecer a hist&oacute;ria do continente africano, em vez de querer ocultar a sua heran&ccedil;a africana, ele vai querer falar: &quot;Opa! Eu tamb&eacute;m fa&ccedil;o parte disso!&quot; O que vejo na minha sala de aula &eacute; uma mudan&ccedil;a cristalina no rosto do aluno entre o primeiro e o &uacute;ltimo dia de aula, porque a gente revela uma riqueza completamente desconhecida e, com isso, voc&ecirc; abre a possibilidade da autoestima.<br /> <br /> Eis que o Brasil &eacute; na&ccedil;&atilde;o de etnias mescladas, para cuja sobreviv&ecirc;ncia conv&eacute;m seja plenamente reconhecida e vivida a sua brilhante mesti&ccedil;agem. Justamente porque nela consiste a sua for&ccedil;a.<br /> &nbsp;<br /> <b>O Brasil &eacute; uma grei globalizante</b><br /> &nbsp;<br /> Volvendo os olhos para o nosso pa&iacute;s - conforme escrevi em Cr&ocirc;nicas e Entrevistas (2000) -, repleto de descendentes de imigrantes e, tamb&ecirc;m, de migrantes esperan&ccedil;osos de que finalmente sejam integrados no melhor do seu tecido social, confirma-se a evid&ecirc;ncia de que possui um dos mais extraordin&aacute;rios povos do orbe, e com caracter&iacute;sticas privilegiadas, em virtude de sua fant&aacute;stica miscigena&ccedil;&atilde;o. Ele &eacute; uma grei... globalizante...<br /> &nbsp;<br /> <b>Mistura de etnias</b><br /> &nbsp;<br /> O jornalista, professor, historiador, ensa&iacute;sta e engenheiro fluminense Euclides da Cunha (1866-1909), not&aacute;vel mesti&ccedil;o brasileiro, foi grande entusiasta da Amaz&ocirc;nia e do Nordeste de nosso territ&oacute;rio. Suas descri&ccedil;&otilde;es daquela sofrida regi&atilde;o o consagraram com o t&iacute;tulo de maior escritor do seu tempo e est&atilde;o registradas em sua obra-prima Os sert&otilde;es. Nela, narra os horrores da Guerra de Canudos e consegue, com isso, modificar a imagem que o sul do pa&iacute;s fazia da regi&atilde;o e do homem sertanejo. &Eacute; dele a famosa frase:<br /> <br /> - O sertanejo &eacute;, antes de tudo, um forte.<br /> <br /> Sobre a miscigena&ccedil;&atilde;o na Terra de Santa Cruz, ele anotou em 15 de agosto de 1897:<br /> <br /> - &Iacute;ndoles diversas, homens nascidos em climas distintos por muitos graus de latitude, contrastando nos h&aacute;bitos e tend&ecirc;ncias &eacute;tnicas, variando nas apar&ecirc;ncias; frontes de todas as cores - do mestio trigueiro ao caboclo acobreado e ao branco - aqui chegam e se unificam sob o influxo de uma aspira&ccedil;&atilde;o &uacute;nica.<br /> <br /> <b>Que descri&ccedil;&atilde;o vibrante!</b><br /> <br /> Para n&oacute;s, da LBV e da Religi&atilde;o de Deus, do Cristo e do Esp&iacute;rito Santo, s&oacute; existe uma ra&ccedil;a, a Ra&ccedil;a Universal dos Filhos de Deus, os Cidad&atilde;os do Esp&iacute;rito.<br /> <br /> E achamos que a obriga&ccedil;&atilde;o de gente civilizada &eacute; entender-se civilizadamente.<br /> &nbsp;<br /> <img src="http://www.novoeste.com/uploads/image/artigos_paiva-neto_lbv.jpg" alt="" width="60" hspace="3" height="80" align="left" /><br /> <br /> Por <b><u><i>Jos&eacute; de Paiva Netto</i></u></b> - Jornalista, radialista e escritor.<br /> paivanetto@lbv.org.br - www.boavontade.com