A prisão de Fabrício Queiroz

18 de junho de 2020 às 15:43

Rodrigo Augusto Prando
A recorrente quest&atilde;o &quot;Onde est&aacute; o Queiroz?&quot; teve, hoje, sua resposta. Fabr&iacute;cio Queiroz foi preso, em Atibaia, na casa de seu advogado, que tamb&eacute;m &eacute; advogado do Presidente Jair Bolsonaro. O Governo Bolsonaro aparenta ser um emaranho de fios eletrizados e desencapados, sendo que, em algum momento, quando estes fios encostarem uns nos outros, o curto-circuito parece ser evidente. Queiroz, portanto, &eacute; um desses fios que, h&aacute; muito, traz preocupa&ccedil;&atilde;o ao cl&atilde; Bolsonaro. <br /> <br /> O personagem em tela &eacute; investigado por suposta participa&ccedil;&atilde;o no esquema de &quot;rachadinha&quot; no gabinete de Fl&aacute;vio Bolsonaro, ainda no Rio de Janeiro. Hoje, Fl&aacute;vio &eacute; Senador da Rep&uacute;blica. A tal pr&aacute;tica consistia em contratar assessores e, depois, recolher parte dos sal&aacute;rios que voltavam para a conta do pol&iacute;tico. Al&eacute;m disso, h&aacute; in&uacute;meros dep&oacute;sitos suspeitos na conta de Fl&aacute;vio e, n&atilde;o menos importante, um cheque de Queiroz que foi depositado na conta da esposa do presidente da rep&uacute;blica. Se Queiroz era funcion&aacute;rio de Fl&aacute;vio, a filha de Queiroz era funcion&aacute;ria de Jair Bolsonaro. &Eacute; ou n&atilde;o um conjunto de fios eletrizados? <br /> <br /> Essa investiga&ccedil;&atilde;o em curso, com a pris&atilde;o de Queiroz, bem como suas implica&ccedil;&otilde;es no n&uacute;cleo do poder da rep&uacute;blica, s&atilde;o, sociologicamente, reveladores da cultura brasileira, especialmente, da cultura pol&iacute;tica. Vejamos, portanto, como, na origem de tudo isso, encontra-se a enorme dificuldade de separa&ccedil;&atilde;o entre interesses privados e interesses p&uacute;blicos, entre as a&ccedil;&otilde;es afetivas e as a&ccedil;&otilde;es racionais, entre o espa&ccedil;o da casa e o da rua, entre rela&ccedil;&otilde;es pessoais (familiares) e impessoais (institucionais). Tudo conjugado, forma um dos dilemas da sociedade brasileira, como bem podemos observar na essencial obra do antrop&oacute;logo Roberto DaMatta, seja em &quot;A casa &amp; a rua&quot; ou em &quot;Carnavais, malandros e her&oacute;is&quot;. Em linhas bastantes gerais - por quest&atilde;o de brevidade - h&aacute; uma distin&ccedil;&atilde;o entre os elementos atinentes &agrave; casa, &agrave; fam&iacute;lia, cujo teor afetivo &eacute; evidente, e a rua, o espa&ccedil;o p&uacute;blico e as institui&ccedil;&otilde;es, na qual a racionalidade e impessoalidade deveriam prevalecer. Um assessor pol&iacute;tico, por exemplo, deveria ser contratado por suas qualidades profissionais, capacidade de gest&atilde;o, conhecimento t&eacute;cnico e da burocracia estatal, assim como tra&ccedil;os intelectuais de lideran&ccedil;a e senso &eacute;tico apurado. Mas, naquilo que se pode depreender da evolu&ccedil;&atilde;o pol&iacute;tica dos Bolsonaros, h&aacute; o pai, patriarca, no bojo da pol&iacute;tica, a ex-esposa, os filhos e isso nada teria de problema, j&aacute; que todos foram eleitos e, por isso, teriam atribui&ccedil;&otilde;es institucionais pr&oacute;prias e em distintos n&iacute;veis da Federa&ccedil;&atilde;o e nos poderes Executivo e Legislativo. O problema - um grande problema - &eacute; quando os interesses pessoais e familiares se apoderam dos cargos e fun&ccedil;&otilde;es p&uacute;blicas, rompendo a salutar barreira republicana que existe entre os interesses privados e p&uacute;blicos. Asseverou na d&eacute;cada de 1930, S&eacute;rgio Buarque de Holanda, em &quot;Ra&iacute;zes do Brasil&quot;, que o &quot;Estado n&atilde;o &eacute; uma amplia&ccedil;&atilde;o do c&iacute;rculo familiar&quot;. <br /> <br /> Dado seu hist&oacute;rico, hoje, por certo, quem reagir&aacute; a pris&atilde;o de Queiroz, assentado na for&ccedil;a da emo&ccedil;&atilde;o, ser&aacute; Jair, o pai, e n&atilde;o Jair Bolsonaro, o Presidente da Rep&uacute;blica. Segundo noticiado, Bolsonaro convocou ministros e seus principais auxiliares para explicar o envolvimento do advogado Frederick Wassef, que representa o Senador Fl&aacute;vio e o pr&oacute;prio presidente, no sumi&ccedil;o e no aparecimento de Queiroz em sua resid&ecirc;ncia. Por certo, avaliam qual o impacto da pris&atilde;o no centro do poder pol&iacute;tico brasileiro. A crise da pandemia fica para a semana que vem... <br /> <br /> Por <i><b>Rodrigo Augusto Prando</b></i> &eacute; professor e pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Graduado em Ci&ecirc;ncias Sociais, Mestre e Doutor em Sociologia, pela Unesp<br />