O dia dos professores no bojo da pandemia

15 de outubro de 2020 às 17:30

Rodrigo Augusto Prando
A educa&ccedil;&atilde;o &eacute; tema dos mais relevantes para a Sociologia, tanto que h&aacute; todo um conjunto de teorias e autores dedicados &agrave; Sociologia da Educa&ccedil;&atilde;o. Certamente, as reflex&otilde;es sociol&oacute;gicas nos dar&atilde;o, brevemente, contribui&ccedil;&otilde;es acerca da educa&ccedil;&atilde;o no bojo desta pandemia que tomou o ano de 2020 de assalto. <br /> <br /> A comemora&ccedil;&atilde;o do &quot;<i><b>Dia dos Professores</b></i>&quot; reclama especial aten&ccedil;&atilde;o a este profissional que, nas mais diversas escolas e nas mais distintas fases da educa&ccedil;&atilde;o formal, est&atilde;o presentes nas vidas dos alunos. Ambos - alunos e professores - s&atilde;o cidad&atilde;os marcados pela sociedade em que vivem, pela situa&ccedil;&atilde;o econ&ocirc;mica, pol&iacute;tica, social e cultural do pa&iacute;s. Professores, junto aos seus alunos, mas, tamb&eacute;m, com os funcion&aacute;rios das escolas e universidades, daqueles que se dedicam &agrave; faxina at&eacute; as secretarias, s&atilde;o parte deste dia de jubilo. A educa&ccedil;&atilde;o &eacute; um processo social, parte fundamental da socializa&ccedil;&atilde;o das crian&ccedil;as e jovens e, por isso, deixa marcas indel&eacute;veis em nossas vidas: positivas e algumas, infelizmente, negativas. O Brasil continua amargando posi&ccedil;&otilde;es muito ruins nos rankings internacionais que aferem a qualidade do ensino e do aprendizado. E isso s&oacute; mudar&aacute; com esfor&ccedil;o coletivo, dos professores, dos alunos, da fam&iacute;lia e de toda a sociedade. Ainda n&atilde;o optamos pela educa&ccedil;&atilde;o como elemento de desenvolvimento de nossa na&ccedil;&atilde;o. J&aacute; n&atilde;o bastassem todas as dificuldades cotidianas do processo educacional, cujas diferen&ccedil;as s&atilde;o evidentes entre o ensino p&uacute;blico e o privado, fomos, todos, neste ano, for&ccedil;ados a repensar nossas estrat&eacute;gias de ensino por conta do coronav&iacute;rus. <br /> <br /> Professores, em muitos casos, tiveram que se adaptar, por conta e risco, ao ensino remoto, n&atilde;o presencial. Muitos outros nem sequer tiveram condi&ccedil;&otilde;es de dar continuidade &agrave;s aulas, j&aacute; que n&atilde;o possuem computadores, smartphones e acesso &agrave; Internet veloz e est&aacute;vel. As desigualdades - de renda, de oportunidades, regionais, entre outras - s&atilde;o estruturais em nossa sociedade e, na conjuntura pand&ecirc;mica, se agudizaram. Professores, gestores das escolas, pais, crian&ccedil;as e jovens ficaram (ou ainda est&atilde;o) perdidos nessa situa&ccedil;&atilde;o at&iacute;pica, anormal, de atividades com aulas s&iacute;ncronas e ass&iacute;ncronas. Colegas professores - do Ensino Fundamental at&eacute; o Ensino Superior - buscaram conhecer melhor as ferramentas e as plataformas que permitem uma aula n&atilde;o presencial, a partir de suas casas. Muitos professores, em seus computadores, d&atilde;o aulas vendo apenas sua pr&oacute;pria imagem, pois a grande parte dos alunos, por motivos diversos e muitas vezes justos, n&atilde;o se sentem &agrave; vontade para &quot;<i><b>abrir</b></i>&quot; sua c&acirc;mera. Um par&ecirc;ntesis: leciono para seis turmas neste semestre e apenas dois alunos assistem as aulas com sua c&acirc;mera aberta e isso j&aacute; torna minha quarta e quinta-feira mais agrad&aacute;veis! Nossas casas, o reduto da intimidade da fam&iacute;lia, foi &quot;<i><b>invadida</b></i>&quot;. N&atilde;o teve jeito. S&atilde;o aulas ministradas do escrit&oacute;rio, das bibliotecas, da sala, da mesa da cozinha. E, desta forma, professores se esfor&ccedil;aram para n&atilde;o deixar &quot;<i><b>a peteca cair</b></i>&quot;.<br /> &nbsp;<br /> Quantos pais, hoje, conhecem melhor seus filhos? O comportamento em casa, durante a aula ou na realiza&ccedil;&atilde;o das tarefas, &eacute; o mesmo na escola, na sala de aula? Eu, que decidi ser professor l&aacute; pelos 15 anos, fui colocado na berlinda pelo meu filho, com seis anos. Aqui, em casa, minha esposa e eu estamos em aula remota, muitas vezes em hor&aacute;rios iguais e, ainda, com as lives, aulas e tarefas de nosso filho. Meus alunos, universit&aacute;rios, tem maior maturidade para encarar esse per&iacute;odo que vivenciamos. Meu filho e, confesso, eu mesmo, talvez n&atilde;o tenhamos toda a maturidade necess&aacute;ria. Logo no come&ccedil;o da pandemia, terminei minha aula e fui ajudar nas tarefas do meu garoto. Estudamos o Egito Antigo, fizemos uma pir&acirc;mide de papel&atilde;o, fizemos um desenho e constru&iacute;mos ferramentas. Foi tudo bem. Depois, veio a leitura de textos curtos. A&iacute;, a coisa desandou. N&atilde;o queria ler. E eu insistindo na import&acirc;ncia da leitura. N&atilde;o lia. Fazia provoca&ccedil;&atilde;o e queria ligar a televis&atilde;o. Irritado dei um grito: &quot;<i><b>vai ler, sim, depois, televis&atilde;o</b></i>&quot;. Assustado, meu filho questionou: &quot;<i><b>Papai, voc&ecirc; grita assim com seus alunos?</b></i>&quot;. Fiquei sem rea&ccedil;&atilde;o, olhando para ele. Depois, respondi: &quot;<i><b>N&atilde;o filho, meus alunos, na maioria das vezes, fazem o que pe&ccedil;o e n&atilde;o ficam me provocando, choramingando, querendo ver televis&atilde;o</b></i>&quot;. E devolvi com uma pergunta: &quot;<i><b>Voc&ecirc; tamb&eacute;m se comporta assim na sala de aula, com sua professora</b></i>&quot;. E ele, calmamente, me respondeu: &quot;<i><b>Eu n&atilde;o. Tenho vergonha, da professora e dos meus amigos. De voc&ecirc; e da mam&atilde;e eu n&atilde;o tenho vergonha, falo o que quero</b></i>&quot;. Fui ler o que os psic&oacute;logos e especialistas em educa&ccedil;&atilde;o infantil estavam publicando. Desisti. Muitos estavam teorizando em abstrato e, concretamente, a coisa era bem mais complicada. Filho de um amigo me disse, dias atr&aacute;s, que nas tarefas de matem&aacute;tica, o pai fica t&atilde;o irritado que &quot;<i><b>a veia do olhos at&eacute; pula</b></i>&quot;! Ensinar &eacute; um of&iacute;cio, com elementos racionais de planejamento de uma aula, a forma mais pertinente de abordar o conte&uacute;do, de relacion&aacute;-lo &agrave; vida do aluno, usando a did&aacute;tica apropriada &agrave; idade e &agrave; realidade social que estamos inseridos. No entanto, n&atilde;o h&aacute; racionalidade pura, j&aacute; que nossas emo&ccedil;&otilde;es e nossos valores afloram e se fazem presentes. <br /> <br /> Com tudo isso que estamos passando, ser&aacute; que os pais ou a sociedade, ao terminar a pandemia, v&atilde;o rever - e valorizar - o papel do professor e da escola? Sairemos, coletivamente, fortalecidos desta pandemia? Doravante, os pais ou respons&aacute;veis pelas crian&ccedil;as e jovens estar&atilde;o mais presentes neste processo, como indicam a Constitui&ccedil;&atilde;o e o Estatuto da Crian&ccedil;a e do Adolescente? Quero crer que sim. Quero acreditar que essa experi&ecirc;ncia nos ajudar&aacute; a melhor compreender o papel do professor e da educa&ccedil;&atilde;o na vida das pessoas. Basta querermos. Que a educa&ccedil;&atilde;o seja, para todos, algo essencial e que seja uma b&uacute;ssola para seguirmos pelo caminho da forma&ccedil;&atilde;o cidad&atilde; e profissional. A todos os professores meu desejo de felicidade n&atilde;o pelo dia de hoje, mas pela escolha profissional e pela dedica&ccedil;&atilde;o &agrave; causa da educa&ccedil;&atilde;o!<br /> <br /> Por <i><b>Rodrigo Augusto Prando</b></i> &eacute; professor e pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie, do Centro de Ci&ecirc;ncias Sociais e Aplicadas. Graduado em Ci&ecirc;ncias Sociais, Mestre e Doutor em Sociologia, pela Unesp de Araraquara. <br />