O recado político do Suave Milagre

22 de junho de 2021 às 21:44

José de Paiva Netto
Jos&eacute; Maria E&ccedil;a de Queiroz (1845-1900) &eacute; por muitos aplaudido como o maior romancista portugu&ecirc;s. O autor de A Ilustre Casa de Ramires, cr&iacute;tico mordaz da sociedade de seu tempo, escreveu uma das mais comoventes p&aacute;ginas da literatura mundial. Contudo, poucos alcan&ccedil;aram a sua mensagem pol&iacute;tica.<br /> <br /> Numa hora de tanta materialidade, em que o ser humano, sufocado pela viol&ecirc;ncia, come&ccedil;a a procurar acentuadamente no Amparo Divino socorro para os seus desesperos particulares e coletivos, s&oacute; lhe pode fazer bem, enquanto pacientemente aguarda pelas solu&ccedil;&otilde;es terrenas, a recorda&ccedil;&atilde;o da s&uacute;plica de um pequenino atendida por um dos maiores s&iacute;mbolos de solidariedade de que se tem not&iacute;cia:<br /> <br /> &ldquo;Nesse tempo Jesus ainda n&atilde;o sa&iacute;ra da Galileia, das margens do lago de Genesar&eacute;; mas a nova dos Seus milagres chegara j&aacute; a Siqu&eacute;m, cidade rica, entre vinhedos, no pa&iacute;s de Samaria. Ora, junto a Siqu&eacute;m, num casebre, vivia uma vi&uacute;va desgra&ccedil;ada entre todas, que tinha um filho doente com as febres. O ch&atilde;o miser&aacute;vel n&atilde;o estava caiado, nem nele havia enxerga. Na l&acirc;mpada de barro vermelho secara o azeite. O gr&atilde;o faltava na arca, o ru&iacute;do dormente do moinho dom&eacute;stico cessara, e esta era em Israel a evid&ecirc;ncia cruel de infinita mis&eacute;ria. A pobre m&atilde;e, sentada a um canto, chorava. E, estendida sobre os joelhos, embrulhada em farrapos, p&aacute;lida e tremendo, a crian&ccedil;a pedia-lhe, numa voz d&eacute;bil como um suspiro, que lhe fosse chamar esse Rabi da Galileia, de quem ouvira falar junto ao po&ccedil;o de Jac&oacute;, que amava as crian&ccedil;as, que nutria as multid&otilde;es e curava todos os males humanos com a car&iacute;cia das Suas m&atilde;os. E a m&atilde;e dizia, chorando:<br /> <br /> &ldquo;&mdash; Como queres tu, meu filho, que eu te deixe e v&aacute; procurar o Rabi da Galileia? Obed &eacute; rico e tem servos, eu os vi passar, e embalde buscaram Jesus por arraiais e cidades, desde Corazim at&eacute; o pa&iacute;s de Moab. Septimus &eacute; forte, tem soldados, e tamb&eacute;m os vi passar, e perguntavam por Jesus sem O acharem, desde o Hebron at&eacute; o mar. Como queres tu que eu te deixe? Jesus est&aacute; longe, e nossa dor est&aacute; conosco. E sem d&uacute;vida o Rabi, que l&ecirc; nas sinagogas novas, n&atilde;o escuta as queixas de uma m&atilde;e de Samaria, que s&oacute; sabe ir orar, como outrora, no alto do monte Garizim.<br /> <br /> &ldquo;A crian&ccedil;a, com os olhos cerrados, p&aacute;lida e como morta, murmurou o nome de Jesus, e a m&atilde;e, chorando, continuou:<br /> <br /> &ldquo;&mdash; De que servir&aacute;, meu filho, partir e ir procur&aacute;-Lo? Longas s&atilde;o as estradas da S&iacute;ria, curta &eacute; a piedade dos homens. Vendo-me t&atilde;o pobre e t&atilde;o s&oacute;, os c&atilde;es viriam ladrar-me &agrave; porta dos casais. Decerto Jesus morreu e com Ele morreu, uma vez mais, toda a esperan&ccedil;a dos tristes.<br /> <br /> &ldquo;P&aacute;lida e desfalecida, a crian&ccedil;a murmurou de novo:<br /> <br /> &ldquo;&mdash; Mam&atilde;e, eu queria ver Jesus da Galileia!<br /> <br /> &ldquo;E logo, abrindo devagar a porta, Jesus, sorrindo, disse-lhe: &lsquo;Aqui estou!&rsquo;&rdquo;<br /> <br /> &ldquo;O Suave Milagre&rdquo; saiu pela primeira vez na Revista Moderna, em 1898. Seu recado, por&eacute;m, continua atual.<br /> <br /> Ele fez a Sua parte<br /> <br /> Mesmo estando longe, Jesus veio e realizou o Seu compromisso para servir ao apelo de uma crian&ccedil;a. Hoje, n&atilde;o h&aacute; mais dist&acirc;ncias. Todavia, que tem sido este planeta sen&atilde;o um menino enfermo por s&eacute;culos de beliger&acirc;ncia? &Eacute; preciso chegar junto &agrave; Alma esquecida dos povos. Portanto, Paz pela internet, que em parte &eacute; o sistema nervoso alterado da sociedade tecnol&oacute;gica.<br /> <br /> <img src="http://www.novoeste.com/uploads/image/artigos_paiva-neto_lbv.jpg" width="60" hspace="3" height="80" align="left" alt="" /><br /> <br /> Por <i><b>Jos&eacute; de Paiva Netto</b></i> ― Jornalista, radialista e escritor.<br /> paivanetto@lbv.org.br &mdash; www.boavontade.com <br />