Maria Bethânia, sua música sólida resiste

22 de junho de 2021 às 21:49

<b>A liquidez do tempo, da vida e da cultura </b><br /> &nbsp;<br /> O fen&ocirc;meno da liquidez dos tempos, da vida, das coisas, do SER, &eacute; descrito por Bauman (2001), soci&oacute;logo polon&ecirc;s, como um momento de ruptura na hist&oacute;ria.&nbsp; Para este pensador, sa&iacute;mos de um mundo s&oacute;lido, seguro, do dualismo entre o certo e o errado, o bem e o mal, capitalismo e socialismo, oito ou oitenta e do amor eterno &ldquo;at&eacute; que a morte os separe&rdquo;, para um mundo l&iacute;quido, inseguro, incerto, da multiplicidade de possibilidades, do hibridismo que mistura praticamente tudo, da instabilidade, da valoriza&ccedil;&atilde;o da imagem e descr&eacute;dito do conte&uacute;do, da vontade do agora e despreocupa&ccedil;&atilde;o com o futuro, da morte da met&aacute;fora que na verdade nem conseguiu nascer, pois a l&iacute;ngua foi reduzida, reconstru&iacute;da, redesenhada, &ldquo;refeita&rdquo; e o que era poesia se reinventa num jogo de palavras que n&atilde;o se cruza, mas acaba fazendo algum sentido para algu&eacute;m em algum lugar da rede. <br /> <br /> Como a m&uacute;sica de Maria Beth&acirc;nia se relaciona com tudo isso? O que posso dizer &eacute; que a m&uacute;sica sofre influ&ecirc;ncias das mudan&ccedil;as pol&iacute;tico-econ&ocirc;mico-culturais que acontecem no mundo e que o fen&ocirc;meno da liquidez, tamb&eacute;m, ocorre na produ&ccedil;&atilde;o musical brasileira. Beth&acirc;nia, ao contr&aacute;rio, dessa liquefa&ccedil;&atilde;o musical, se mant&eacute;m firme na sua miss&atilde;o de explorar aquilo que h&aacute; de mais po&eacute;tico e criativo na nossa composi&ccedil;&atilde;o. <br /> <br /> N&atilde;o se pode afirmar que toda a m&uacute;sica &eacute; l&iacute;quida, superficial, imag&eacute;tica, carente de sentido, mas uma parte significativa dessa produ&ccedil;&atilde;o art&iacute;stica vive esse momento e serve obviamente aos interesses da ind&uacute;stria cultural que acaba levando e impondo para as r&aacute;dios populares, televis&otilde;es, internet e suas redes um produto que se dissolve muito r&aacute;pido no ar, caindo no esquecimento com a mesma rapidez que surgiu. N&atilde;o vou &ldquo;fulanizar&rdquo;, mas fa&ccedil;am suas conex&otilde;es que logo ir&atilde;o perceber o que estamos chamando de m&uacute;sica l&iacute;quida. <br /> &nbsp;<br /> Beth&acirc;nia, &ldquo;Abelha Rainha&rdquo;[2] <br /> &nbsp;<br /> Maria Beth&acirc;nia Viana Teles Veloso, natural de Santo Amaro, Bahia, nascida em 18 de junho de 1946. Nesse ano, completa 75 anos de muita dedica&ccedil;&atilde;o ao seu of&iacute;cio de compor, cantar e fortalecer a m&uacute;sica brasileira. Chico Buarque, Chico C&eacute;sar, Vanessa da Mata, Adriana Calcanhoto, Paulo Cesar Pinheiro, Rosinha de Valen&ccedil;a, Gilberto Gil, Roque Ferreira, Dorival Caymmi, Almir Sater, Paulinho da Viola, Rita Ribeiro, Wally Salom&atilde;o, Vinicius de Moraes, Roberto Mendes, Roberto e Erasmo Carlos e seu querid&iacute;ssimo irm&atilde;o Caetano Veloso, s&atilde;o alguns e algumas das compositoras e compositores gravados por Beth&acirc;nia.<br /> <br /> A m&uacute;sica de Beth&acirc;nia &eacute; pura poesia, qualidade, conte&uacute;do que solidifica sua obra e faz contraste com a fr&aacute;gil m&uacute;sica que ocupa muito pouco tempo no imagin&aacute;rio social e logo &eacute; substitu&iacute;da por outra novidade como provoca a banda os Tit&atilde;s (2001) na m&uacute;sica &ldquo;A Melhor Banda de Todos os Tempos da &Uacute;ltima Semana&rdquo;[3].&nbsp; Beth&acirc;nia &eacute; permanente, n&atilde;o desaparece, pois, sua constru&ccedil;&atilde;o art&iacute;stica opta, em primeira inst&acirc;ncia, pelo conte&uacute;do. Beth&acirc;nia sempre foi muito cuidadosa com as palavras, pois seu p&uacute;blico merece ouvir/sentir/refletir uma boa can&ccedil;&atilde;o, um bom conte&uacute;do. Sua solidez vem desse respeito com a palavra, respeito pela poesia e seus criadores poetas e poetisas. <br /> &nbsp;<br /> Um poema pra voc&ecirc;<br /> &nbsp;<br /> Diante da sua grandeza e import&acirc;ncia para a cultura do nosso pa&iacute;s, permita-me um poema para comemorar a passagem dos seus, bem vividos, 75 anos. <br /> &nbsp; <div style="margin-left: 40px;"><i><b>MARIA BETH&Acirc;NIA, M&Atilde;E SENHORA<br /> <br /> M&atilde;e Senhora da m&uacute;sica, &eacute;s tu!<br /> M&atilde;e Senhora da palavra, da emo&ccedil;&atilde;o da palavra,<br /> M&atilde;e Senhora das hist&oacute;rias cantadas,<br /> M&atilde;e Senhora daquilo que brota de dentro dos compositores,<br /> a can&ccedil;&atilde;o.<br /> Pron&uacute;ncia, verbo, tempo, fala forte,<br /> Catarse &eacute; pouco para o misto de sentimentos que sua interpreta&ccedil;&atilde;o causa<br /> Palavra de M&atilde;e &eacute; sempre potente.<br /> Beth&acirc;nia, Maria, Maria Beth&acirc;nia,<br /> Filha de Oy&aacute;, de Ians&atilde;, rainha dos raios,<br /> M&atilde;e do entardecer, a for&ccedil;a dos ventos te conduz,<br /> M&atilde;e Senhora da m&uacute;sica, &eacute;s tu!<br /> Seu canto radiante, apaixonante,<br /> Quebra minhas resist&ecirc;ncias,<br /> Idiossincrasias bobas,<br /> Fico &agrave; vontade ent&atilde;o,<br /> Obrigado Maria Beth&acirc;nia,<br /> Palavra de M&atilde;e &eacute; sempre forte.</b></i></div> <br /> Conclus&atilde;o <br /> Parab&eacute;ns, Maria Beth&acirc;nia! <br /> &nbsp;<br /> Refer&ecirc;ncia<br /> BAUMAN, Zygmunt. Modernidade l&iacute;quida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.<br /> <br /> Por Ivandilson Miranda Silva